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Por Escrito

Imagem corporal pós mastectomia

Por Alessandra de Carvalho

Sou professora de História e não consigo discutir ideias abstratamente, sem contar histórias e sem dar o contexto das histórias. Eu gosto de costurar a história! E aqui vai um panorama dessa minha história dolorida, para defender o meu ponto, sobre a verdadeira beleza pessoal.
 
A reconstituição da mama após a Mastectomia é um procedimento que acontece em sequência, na mesma cirurgia; os médicos retiram a mama e já fazem a reconstituição. E assim foi comigo; mas os resultados não foram satisfatórios. Meu corpo estava tão fragilizado, devido ao câncer e a uma anemia que estava acima dos limites aceitáveis para uma cirurgia, que meu corpo não cicatrizava a cirurgia do implante mamário. Não se deu uma rejeição do corpo à prótese, como ocorre com algumas mulheres; a questão era que a pele simplesmente não cicatrizava. E então, após quatro tentativas cirúrgicas e quatro necroses nessa região, com o tempo de começar a quimioterapia chegando ao limite, tive que retirar a prótese e iniciar os tratamentos. A consequência foi que fiquei por 1 ano e 9 meses com apenas a mama esquerda (que não teve câncer) e, literalmente, um buraco do lado direito.
 
Feiúra era o que eu via quando me olhava no espelho; e muitas vezes eu estive ali, me olhando e olhando a feiúra para entender um pouco do processo pelo qual eu estava passando. À época, em meados de 2016, eu não tinha nenhuma ideia da estrada que ainda iria percorrer (e ainda percorro): cirurgias, quimioterapia, radioterapia, internações, reações diversas durante o tratamento.
 
No entanto, havia uma beleza sendo tecida junto com a feiúra; mas era tudo muito silencioso. Eu não conseguia percebê-la, no começo, pois a sobrevivência fala mais alto e a energia física, emocional gasta nesse momento era enorme. Mas ela estava lá, calma, serena e tranquila, tomando forma na minha vida.
 
A questão da imagem de si, seja ela física ou moral (as imagens que podemos comunicar para quem nos observa), é o nosso assunto hoje, e eu gostaria que você pensasse um pouco mais comigo a respeito disso. Muitas vezes ouvimos que “hoje” se valoriza demais o corpo, físico, mas é claro que isso não é verdade. Na Grécia antiga isso já acontecia e com muito mais exigências; nas olimpíadas os participantes ficavam nus para que o corpo com toda a sua beleza fosse admirado. Corpos e rostos humanos eram regularmente esculpidos. Para os gregos a beleza do corpo e a capacidade de reconhece-la ligavam-se de algum modo à inteligência; havia uma palavra para isso ─ kaloskagathos ─ que significa ser bonito de se ver e ser uma boa pessoa.
Gostamos do que é bonito! A beleza nos chama a atenção em todas as esferas: seja na intelectualidade, na moda, na forma de viver de alguém que nos inspire, fisicamente, e por aí vai uma lista imensa…
 
E aqui convido você à meditação honesta. Como sempre recomendo, faça um bom café ou uma xícara de chá e me deixe ser sua companheira de interrogações. Eu pergunto e você responde, uma resposta para cada gole de chá:
 
Qual é o lugar que a imagem ocupa nesse exato momento na minha vida? O que a sociedade atual tem me ensinado sobre a imagem física, e o que eu tenho aprendido com ela? O quanto esse movimento ao redor da beleza física que precisa ser “construída” a qualquer preço tem ocupado minha agenda, minhas conversas, minhas redes sociais, minhas discussões, e minhas frustrações (sejam por falta de dinheiro, falta de paciência, falta de contentamento etc.). Se eu constatar que isso é importante demais para mim, saberia dizer por que é tão importante assim?
 
Mas voltemos à minha história, para fecharmos o quadro que comecei a pintar. Em 2018, ao terminar os tratamentos mais agressivos e com condições de saúde favoráveis, parti para a cirurgia de reconstrução da mama. Era uma técnica diferente: a reconstrução seria com os músculos do abdome reto (os famosos músculos do “tanquinho”) e não com prótese; sendo assim, era uma reconstrução definitiva. Horas e horas de cirurgia e finalmente tudo deu certo! Me adaptar aquele novo “corpo” não foi fácil. Claro que, com um aspecto físico muito mais bonito, fiquei alegre.
 
Mas antes disso, gastei mais de um ano pensando e faria ou não aquela cirurgia. Eu vivia no hospital nos últimos 2 anos, e mais uma cirurgia desse porte me faria ficar mais tempo nesse lugar de paciente; eu não sabia se aguentaria isso de novo. Meu marido era o “Samwise Gamgi” na minha vida de “Frodo”: cuidando, cuidando, cuidando de mim o tempo todo, e a esse respeito ele dizia: “faça o que você suporta, não se preocupe com a estética, não faça nada disso por mim”. Ao mesmo tempo em que essa fala me aliviava, por um lado, por outro eu pensava nele também. Esse não seria o primeiro problema que teríamos que resolver juntos, mas àquela altura parecia o maior em jornada a dois. Outra questão era a opinião médica, que sempre recomendava que eu fizesse a cirurgia logo, devido a minha idade, que eu era jovem e talvez me arrependesse no futuro, se não fizesse… A coisa não era totalmente clara, e muitos pensamentos corriam pela minha mente.
 
 
Me lembro do dia em que me olhei no espelho, quando estava indo para o banho e vi meu corpo muito feio, mutilado, fraco, sem cor; pensei que fisicamente eu não aguentaria passar por mais uma cirurgia extensiva. Chorei no chuveiro, orei e ao final do banho, e surpreendentemente uma alegria sublime me consolava! Não porque estivesse tudo resolvido, mas porque algo novo havia brotado no meu coração e se espalhava por todos os cantos do meu ser.

Foi quando notei que a beleza que estava sendo tecida em mim, junto com a feiúra física, estava mais forte, robusta. Essa beleza era agora mais encorpada, e se manifestava em ações de mudança de hábitos: suavidade, empatia, silêncio, paciência. Notei que essa outra beleza não tinha o primeiro lugar em minha autoimagem, até àquele momento, e que a pouca consciência de mim a deixara fora das vistas por muito tempo.

E então, de um modo não planejado, a solução estética que alcancei, através da medicina – que também é um dom de Deus aos homens – convergiu com o tempo de Deus trabalhar coisas dentro de mim. Entendi que da feiúra Deus pode trazer algumas belezas, e que a beleza física tem mais sentido quando enfeita um coração bom. Entendi a gratidão pela beleza de fora, e o primado da beleza de dentro. Acho que minha autoimagem ganhou uma profundidade.
 
Muitas áreas da minha vida passaram por cirurgias e receberam “upgrades”. Como foram importantes os últimos quinze anos de estudo da Palavra de Deus para me dar “chão” para pisar! Especialmente quando parecia que eu estava caindo no buraco da Alice, no País das Maravilhas. Deus me segurou, sua palavra me sustentou, minha comunidade de fé orou e cuidou de mim, meus amigos e conhecidos estavam comigo e cuidavam de mim, meu marido se tornou um homem mais forte para me amparar e assim o amor cresceu, amadureceu e floresceu, e minhas filhas amadureceram e se fortificaram na fé… e eu sobrevivi, e aprendi a ser mais e mais dependente do Senhor.
 
Quando vem o sofrimento temos duas escolhas a fazer: aprender e melhorar ou não aprender e piorar. Quando o sofrimento está em processo, conseguimos ter essa clareza? Não. O sofrimento vem e derruba os castelos de areia, e as imagens superficiais que construímos de nós mesmos. Durante esses sofrimentos queremos apenas o alívio da dor, seja ela física ou emocional. Mas, se tivermos corações ensináveis e abertos à palavra de Deus, essas se tornam nossas grandes oportunidades de praticar o que aprendemos na vida cristã. Escolha aprender, para que o Senhor seja glorificado e que o evangelho não seja envergonhado.
 
Ter o coração no lugar certo me ajudou a permanecer tranquila durante e depois de todo o processo de Mastectomia. Me ajudou a responder a todas as perguntas que fiz a você alguns parágrafos acima, e ainda me ajuda a escrever esse texto com a esperança de que o Espírito Santo, que nos consola nas tribulações, esteja, nesse momento em que você faz essa leitura, consolando quem está passando por essa questão da imagem pessoal, com mesmo problema pelo qual eu passei ou com outras questões em relação à imagem física que são delicadas, difíceis e dolorosas.
 
Acredite em mim: a beleza interna e a beleza externa não precisam viver brigadas, mas sua relação é assimétrica: primeiro a de dentro, depois a de fora. Quando suas questões sobre a imagem física estão equilibradas, ocupando o lugar certo na sua vida, não há nada de errado em se cuidar, buscar a beleza e ficar bonita; isso faz bem, e deve ser recebido da mão de Deus com gratidão. Mas isso não pode ser a sua razão de viver, pois mais cedo ou mais tarde o valor relativo dessa beleza externa vai ser revelado, por uma doença, uma comparação, um acidente ou pela velhice.
 
Se a beleza física ocupar o centro em sua vida, será apenas outro ídolo, e toda idolatria sempre termina em decepção e desespero. Mas se Deus ocupar o centro em sua vida, suas feiúras e suas belezas serão tomadas por Ele, para fazer uma coisa nova. Você poderá trocar tanto o autodesprezo quanto a obsessão pela aparência por uma beleza tranquila, diante de Deus.
 
Essa é a minha oração é que possamos viver cada dia para glorificar a Deus em todas as áreas de nossa vida, inclusive com nosso corpo como somos. Seja bela, inteira!

Publicado originalmente em Imagem corporal pós mastectomia. Reproduzido com permissão.
 
  • Alessandra de Carvalho casada com Guilherme há 26 anos, mãe da Ana Elisa (23) e Helena (18). Reside em Belo Horizonte e serve na Igreja Esperança. Formada em História, trabalhou 13 anos como professora. Nos últimos anos dedica-se ao Labri Brasil e ao ministério com mulheres na igreja local.
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