Opinião
- 17 de abril de 2018
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Por que a graça não chega para alcançar muçulmanos?
Por Jenny Taylor
A “abordagem da graça” a muçulmanos — um termo retumbante adotado pelo líder de missões Steve Bell como o título do seu importante livro1 — representa os atributos mais nobres da fé cristã. “Mas eu digo-vos: Tenham amor aos vossos inimigos e peçam a Deus por aqueles que vos perseguem” (Mateus 5:44). Depois de um ano de violência no mundo muçulmano, muita da qual afetou países da Europa com uma tradição de envio de missionários, é bom lembrarmo-nos dos padrões elevados de Cristo2. Contudo, como Bell diz claramente, é uma abordagem que só pode surgir da verdade. Qualquer outra coisa retira-lhe o valor.
Equilibrar graça e verdade
Bell foi, ele próprio, “espancado num posto de fronteira Norte Africano; insultado numa rua no Cairo; ameaçado em várias ocasiões com uma barra de ferro, uma bengala, e uma faca na garganta; enganado e usado” por muçulmanos3. Acabou sendo expulso do Cairo pela famosa Polícia Secreta do Egito. Ele leu e estudou muitos dos escritos dos antepassados da reencarnação moderna da jihad4. Quando ele fala de amor, agora na nova casa da Interserve na área de Birmingham, Alum Rock, onde um soldado foi ameaçado com decapitação por servir no Exército Britânico, ele fala com autoridade.
Uma capacidade para enfrentar e interagir com “o lado negro” do Islã é o nosso chamado missionário numa cultura que se habituou à parte confortável. Contudo, como o demonstram os exemplos a seguir, está-se mostrando difícil equilibrar verdade com graça. Qualquer coisa menos do que isso não recebe a aprovação do Espírito Santo e arrisca gerar mais violência.
‘Desespero’
No ano passado, um vigário inglês escolheu um tema invulgar para o sermão do Domingo da Santíssima Trindade: radicalismo islâmico. Apenas três semanas antes, 22 pessoas, a maioria crianças, num concerto na Manchester Arena, haviam sido mortas a caminho de casa. Apenas oito dias antes, oito peões na London Bridge e comensais no Borough Market haviam sido atacados com navalhas e esfaqueados. O vigário abordou a “incompreensibilidade racional” da Trindade e a “compreensibilidade irracional” destes massacres. “Eles deviam estar desesperados”, disse ele. O seu desespero explicava os seus motivos.
Isto não é verdade, mas manifesta uma tendência homogeneizadora pervasiva na cultura ocidental. Todas as religiões não são a mesma coisa, e os seus devotos são expostos a influências intensamente dissonantes que ignoramos demasiado facilmente.
‘Anglicizar’ o Islã
Colin Chapman, antigo enviado especial do Arcebispo da Cantuária à Universidade Al-Azhar, no Cairo, e Diretor da escola de formação Church Mission Society em Birmingham, no Reino Unido, é outro cristão que viveu e trabalhou entre muçulmanos instruídos. No entanto, ele minimiza a diferença, ou, como diz o Steve Bell, a “estranheza” da cultura islâmica para muitos não-muçulmanos.
A sua consideração generosa pelos muçulmanos arrisca dar uma falsa sensação de segurança aos seus leitores no que toca à adequação das nossas respostas, nas palavras do antropólogo Roger Ballard, ao “anglicizar” o Islã. Outros, menos compadecidos, chamam-lhe “colonialismo” — atribuir ao Islã e aos seus seguidores motivos e maneiras que colonizam o seu universo conceptual, tornando-os familiares, e portanto confortáveis de abordar.
Chapman, um escritor influente, viveu muitos anos em Beirute. Para ele, o Islã é geralmente mais vítima de pecado do que pecador. Como o vigário, ele encontra razões para atrocidades. Numa peça extensa para a Fulcrum5 no ano passado, originalmente publicada na revista Transformation6, ele dá nove exemplos de movimentos islamitas — políticos — que usaram violência: “Em todos os casos, houve algo contextualmente específico — a percepção de uma injustiça — que levou os muçulmanos a agir e frequentemente a recorrer à violência.” Isto não é necessariamente verdade. Dois comentaristas recentes atribuem a violência no Levante a “testosterona” e frustração sexual7, como o faz uma edição do aclamado jornal do Instituto Muçulmano, Critical Muslim, dedicada a “Homens no Islã”.8
Embora reconheça que “o Islã político não sanciona necessariamente violência”, ele justifica-o numa generalização que parece negar as categorias altamente complexas de violência do próprio Islão, e as discussões à volta do uso das mesmas. Chapman diz: “Ao mesmo tempo, não é difícil entender que alguns islamitas, frustrados com o progresso lento de criar uma sociedade mais islâmica, ou vítimas de violência extrema dos seus adversários, possam concluir — a partir das suas escrituras, dogma e história — que têm uma justificação para recorrer à violência.”
Sobre a jihad, Chapman afirma, “Como se sabe, o significado básico da palavra jihad é ‘empenho’, e está pouco relacionada com a ideia de ‘guerra santa" — uma afirmação categoricamente desmentida, por exemplo, pelo académico saudita Madawi al-Rasheed na King"s College em Londres”.9
Chapman procura, justa e vigorosamente, formas de abordar e humanizar os islamitas, mas de uma forma que leva o pastor anglicano de Melbourne e especialista no Alcorão, Dr. Mark Durie, a acusá-lo de “impor realidade” ao Islã: uma tática missionária que “não promove a paz”10, acrescenta ele.
Raízes nas escrituras
Shiraz Maher, antigo membro do grupo terrorista Hizb ut Tahrir, é agora Vice-Diretor do International Centre for the Study of Radicalisation (ICSR) na King’s College em Londres. Em agosto, a Penguin publicou o seu doutoramento sobre as raízes do salafismo jihadista nas escrituras e na tradição.11 “Por cada ato de violência, eles [SJ] oferecem alguma referência das escrituras — por muito ténue, esotérica ou contestada que seja.” Tom Holland entrevista Maher no seu filme, JS: The Origins of Violence. Ele compara os textos corânicos a “bombas por explodir”, à espera durante séculos pela próxima ofensa que os recrute para o serviço homicida.12 Maher diz: “Sim, o Estado Islâmico é mais descarado e cruel do que os seus predecessores, mas as ideias que o guiam estão bem estabelecidas no pensamento radical sunita. . . . Este é um ecossistema vasto e variado de densa jurisprudência islâmica que permitiu as ações dos movimentos militantes em todo o mundo. O Estado Islâmico é apenas o seu grupo mais recente e mais bem-sucedido até agora.”
Como cristãos com uma mentalidade missionária, deveríamos conhecer este código de matança, que define com um grau de subtileza surpreendente quando é certo matar pela fé. Peguemos num exemplo: a lei da qisas, ou retribuição: “Quando os militantes aplicam a qisas como um instrumento de lei internacional, eles consideram cada cidadão estrangeiro de um estado inimigo punível pela ação do seu governo” — punível, com efeito, com a morte por apostasia.
O líder da Al-Qaeda, Ayman al-Zawahiri, acreditava que “abdicar da fé era um mal bem maior do que abdicar do dinheiro ou da vida”.13 Mesmo alguns líderes da jihad acham difícil suportar as anátemas indiscriminadas contra muçulmanos de entre os seus pares, segundo Maher. No entanto, Chapman descarta como “textualismo” a tentativa de levar a sério a enorme dinâmica literária interna do Islã, enraizada e justificada nas escrituras e nas tradições a um ponto que só agora está a tornar-se do conhecimento geral. A “abordagem da graça” para com os muçulmanos reconhece este uso da escritura para controlar e aterrorizar, enquanto ao mesmo tempo discerne a necessidade espiritual de muçulmanos individuais, e os desafia com a liberdade do medo prometida por Cristo nas escrituras sobre as quais o próprio Maomé exigia respeito.14
O objetivo de supremacia
A jihad é a virtude predominante numa hierarquia de virtudes para este tipo de Islã. “Em sua essência, o movimento salafista jihadista contemporâneo vê a luta física na causa de Deus como o auge do Islã, o seu zénite e apogeu.”15 Com o Islã agora disperso pelo Ocidente — o antigo dar-ul-harb, ou “casa da guerra” —, isso significa guerra sem escrúpulos, total e constante, organizada por salafistas jihadistas, em relação à qual devemos estar alerta, à medida que o medo que causa, especialmente aos próprios muçulmanos, se espalha pela população mais ampla.
O Islã tem de se defender, até estar justificado pelo seu domínio, e temos de compreender isto e aprender a resistir-lhe. Onde o Islã for dominante, as igrejas vão arder — como aconteceu nos últimos anos no Egito, Iraque, Turquia, Kosovo, Argélia, Kuwait, Paquistão, Irão, Sudão do Sul, Mali, e outros lugares.16 Mark Drurie, que liderou recentemente uma missão na Etiópia, um país de maioria cristã, relata que as igrejas têm, mesmo assim, ardido no norte de maioria muçulmana:17
Os cristãos etíopes opõem-se à islamização e resistem-lhe de muitas formas. Rodeada por nações muçulmanas, a Etiópia é um testemunho da eficácia da resistência cristã à jihad, e também do cristianismo africano nativo. Os seus cristãos ganharam muita experiência ao aprender a não render o poder aos muçulmanos. Contudo, algumas regiões do país têm uma percentagem muito grande de muçulmanos, particularmente no nordeste, e nestas regiões, os cristãos podem ser perseguidos, e.g., com fogos postos em igrejas ou ataques a cristãos. Aparentemente, o mesmo não acontece a muçulmanos em áreas de maioria cristã.
As boas notícias
As boas notícias de Jesus são o único antídoto ao medo e ódio que o Islã por vezes justifica. Há possibilidades para um alcance autêntico e corajoso.
Uma vila em Chiltern Hills, a oeste de Londres, abriga agora alguns dos jihadistas mais aterrorizadores na história do país.18 Mas um cristão paquistanês, Amjad M., coorganizou recentemente uma noite de qawwali com canções sagradas tradicionais na sua casa, com um de três imãs que são conhecidos pregadores do martírio. Veio a descobrir-se que o anfitrião tinha ensinado a filha dele na escola.
Mais um exemplo — da Etiópia — ilustra a abordagem da graça e verdade:
Há alguns anos, uma notícia reportou que uma igreja tinha sido queimada e que os cristãos dessa igreja tinham sido esfaqueados pelos seus vizinhos muçulmanos. Um jovem estudante de seminário comoveu-se de compaixão pela comunidade muçulmana ligada a esta atrocidade, e quis ir partilhar Jesus com eles. Quando não encontrou nenhuma igreja que o apoiasse, foi sem apoio, confiando que Deus providenciaria. Não foi fácil. Mas ele encontrou um muçulmano que queria seguir Jesus, e discipulou-o. Esse homem levou depois a sua família a Cristo, e o ministério começou a expandir. Esse jovem evangelista é agora o pastor de meia-idade de um movimento em rápido crescimento.19
• Jenny Taylor é escritora, jornalista e consultora. Trabalhou em vários meios de comunicação, incluindo as publicações Independent, Time, Spectator e a BBC. Trabalhou e viajou fazendo missões por dez anos antes de fundar a Lapido Media, Centre for Religious Literacy in Journalism. Obteve o doutoramento em Islã e Secularização na Grã-Bretanha pela School of Oriental and African Studies, em Londres, no ano de 2001. As suas obras publicadas incluem, com o Bispo Lesslie Newbigin e o Professor Lamin Sanneh: Faith and Power: Christianity and Islam in Secular Britain publicada pela SPCK e Wipf and Stock, e A Wild Constraint: the Case for Chastity, pela Bloomsbury.
Notas finais
[1] Steve Bell, Grace for Muslims?: The Journey from Fear to Faith (Milton Keynes and Hyderabad: Authentic, 2006).
[2] Nota do editor: Ver artigo de Wafik Wahba intitulado, ‘Witnessing to the Gospel through Forgiveness: a living example from the persecuted Christians in Egypt’, na edição de janeiro de 2018 da Lausanne Global Analysis https://www.lausanne.org/pt-br/recursos-multimidia-pt-br/agl-pt-br/2018-01-pt-br/testemunhando-o-evangelho-atraves-do-perdao.
[3] Bell relata isto no seu artigo Grace in the Dark Side, publicado pela Interserve, Nova Zelândia, na revista Go, edição 1, 2010.
[4] Nota do editor: Ver artigo por autor cujo nome é omitido (não o Steve Bell), intitulado ‘What is the Islamic Caliphate and Why Should Christians Care’, na edição de maio de 2017 da Lausanne Global Analysis https://www.lausanne.org/pt-br/recursos-multimidia-pt-br/agl-pt-br/2017-05-pt-br/o-que-e-um-califado-islamico-e-por-que-os-cristaos-deveriam-interessar-se.
[5] https://www.fulcrum-anglican.org.uk/articles/christian-responses-to-islamism-and-violence-in-the-name-of-islam/ [6] An International Journal of Holistic Mission Studies, 34:2 (maio 2017), 115-30.
[7] http://www.telegraph.co.uk/comment/11041338/The-science-behind-Isils-savagery.html [8] Critical Muslim Volume 08 - Men in Islam – editada por Ziauddin Sardar e Robin Yassin-Kassab.
[9] Madawi al-Rasheed, ‘Rituals of Life and Death: the Politics and Poetics of Jihad in Saudi Arabia’ in Madawi Al-Rasheed and Marat Shterin, Dying for Faith (Tauris 2009), 81.
[10] Ver o comentário de Drurie no final do artigo de Chapman, Christian Responses to Islamism.
[11] Shiraz Maher, Salafi-Jihadism: the History of an Idea (London: Penguin, 2017).
[12] Jonathan Birt investigou, como observador participante, o desenvolvimento de uma “teologia da injustiça” por jovens muçulmanos britânicos, para quem a Chechénia era considerada demasiado distante, e a comunidade muçulmana local “moralmente corrupta”. “Era preciso olhar para fora para uma grande causa — neste caso, a causa da jihad global”. Em ‘The Radical Nineties Revisited: Jihadi Discourses in Britain’ In Madawi al-Rasheed & Marat Shterin (eds) Dying for Faith: Religiously Motivated Violence in the Contemporary World (London & New York: I B Tauris, 2009), 107.
[13] Shiraz Maher, Salafi-Jihadism: The History of an Idea (London: Penguin, 2017), 63.
[14] Nota do editor: Ver artigo de Ida Glaser intitulado, ‘How Should Christians Relate to Muslims: Developing a Biblical Worldview on Islam’, na edição de maio de 2017 Lausanne Global Analysis https://www.lausanne.org/pt-br/recursos-multimidia-pt-br/agl-pt-br/2017-05-pt-br/como-os-cristaos-devem-se-relacionar-com-os-muculmanos.
[15] Shiraz Maher, Salafi-Jihadism, 32.
[16] https://www.gatestoneinstitute.org/7542/churches-under-islam [17] Correspondência pessoal do autor com intercessores.
[18] http://www.lapidomedia.com/abyssinian-moment-in-chiltern-hills [19] Carta de oração ao autor.
- 17 de abril de 2018
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