Apoie com um cafezinho
Olá visitante!
Cadastre-se

Esqueci minha senha

  • sacola de compras

    sacola de compras

    Sua sacola de compras está vazia.
Seja bem-vindo Visitante!
  • sacola de compras

    sacola de compras

    Sua sacola de compras está vazia.

Opinião

Ortodoxia e Narcisismo (parte 2)

O narcisismo é a marca do século. Se o século 19 foi marcado pela cultura racional, o século 20 foi o século da cultura terapêutica. Uma cultura que, ao intensificar o individualismo, legitimou uma forma de “divinização do self”. A saúde mental e o bem-estar tornaram-se substitutos para a salvação. O que o ser humano busca hoje não é a salvação através do arrependimento e fé, mas o sentir-se bem e confortável. A cultura terapêutica introduziu um modelo de relacionamento que rejeita qualquer forma de julgamento, fazendo com que o indivíduo crie sua própria realidade.
 
Não existem limites para o “ego” narcisista, carente e faminto. A consciência de dever para com o outro foi substituída pelo “dever que tenho para comigo”. A busca pela autorrealização, autossatisfação, autossuficiência, descrevem o frágil reconhecimento do outro. Tudo isto nos leva a viver a partir daquilo que é aparente. Nós nos preocupamos mais com o exterior e não com o interior. Esta preocupação nos leva a fugir de nossa realidade pessoal mais profunda, das frustrações decorrentes de relacionamentos superficiais e frágeis, vivendo numa agitação constante, agenda cheia, negando a realidade interior e pessoal.
 
Os desdobramentos deste espírito narcisista e secularizado é grande e profundo para a igreja de Jesus Cristo. Os líderes cristãos estão cada vez mais ocupados com suas agendas e projetos pessoais na busca frenética de autoafirmação. Seus relacionamentos não são nem pessoais, nem profundos, o que os leva a cultivarem uma forma de “irrealismo ministerial”. Acham que estão “conectados” por participarem de redes sociais, mas a família encontra-se fragmentada e adoecida. Fazem comentários, declarações, que não tem nenhuma relação com a forma que vivem. É justamente aqui que muitos líderes caem porque vivem a partir de uma fantasia e não da realidade.
 
A afirmação de João Batista em relação a Cristo é invertida pelo espírito narcisista. Ao invés de dizer: “convém que ele cresça e que eu diminua”, passamos a dizer: “convém que ele diminua para que eu cresça”. Os modelos de ministério e de espiritualidade têm por objetivo aumentar o senso de autoimportância, e não o contrário. Queremos ser nosso próprio “messias”. Frutos do Espírito como humildade, mansidão, bondade, não são buscados, muito menos desejados. A necessidade de autoafirmação é tão intensa que preferimos ser cercados de bajuladores do que de irmãos e irmãs que nos ajudam a viver de forma mais verdadeira diante de Deus.
 
O maior obstáculo para a igreja de Jesus Cristo viver em unidade como povo de Deus somos nós mesmos. Nos critérios diagnósticos para o Transtorno da Personalidade Narcisista encontramos algumas características que refletem bem o perfil da liderança cristã. Segundo a Dra. Elaine Marini (com base no Manual de Diagnósticos de Transtornos nº 4), este transtorno descreve “Um padrão invasivo de grandiosidade (em fantasia ou comportamento), necessidade de admiração e falta de empatia, que começa no início da idade adulta e está presente em uma variedade de contextos, indicado por pelo menos cinco dos seguintes critérios:
 
(1) sentimento grandioso da própria importância (por exemplo, exagera realizações e talentos, espera ser reconhecido como superior sem realizações comensuráveis);
 
(2) preocupação com fantasias de ilimitado sucesso, poder, inteligência, beleza ou amor ideal;
 
(3) crença de ser "especial" e único e de que somente pode ser compreendido ou deve associar-se a outras pessoas (ou instituições) especiais ou de condição elevada;
 
(4) exigência de admiração excessiva;
 
(5) sentimento de intitulação, ou seja, possui expectativas irracionais de receber um tratamento especialmente favorável ou obediência automática às suas expectativas;
 
(6) é explorador em relacionamentos interpessoais, isto é, tira vantagem de outros para atingir seus próprios objetivos;
 
(7) ausência de empatia: reluta em reconhecer ou identificar-se com os sentimentos e necessidades alheias;
 
(8) frequentemente sente inveja de outras pessoas ou acredita ser alvo da inveja alheia;
(9) comportamentos e atitudes arrogantes e insolentes.
 
O curioso é que no próximo Manual de Diagnósticos de Transtornos (nº 5) que será publicado em 2012, o Transtorno de Personalidade Narcisista será retirado. Deixará de ser uma patologia. Imagino que para estes “cientistas”, quando uma patologia torna-se um padrão de comportamento, deixa de ser patologia e passa a ser um comportamento normal. Por este critério, muitos líderes cristãos deveriam estar numa clínica, e não num púlpito.  
É este espírito, ao meu ver, o maior inimigo à identidade comum que precisamos ter como povo de Deus. Existem duas afirmações de Paulo em sua carta a Tito que descrevem posturas distintas em relação aos líderes cristãos e a formação do povo de Deus:
 
1. “No tocante a Deus, professam conhecê-lo; entretanto, o negam por suas obras; é por isso que são abomináveis, desobedientes e reprovados para toda boa obra” (1.16) – A negação do conhecimento de Deus vem pela ausência da prática das boas obras. A fé sem obras é morta. Conhecimento de Deus sem a ética e a espiritualidade adequada a este conhecimento é vazio. Estes líderes falam muito, agitam-se muito, mas permanecem vazios e negam a doutrina de Cristo e dividem o povo de Deus. São líderes narcisistas. Pensam mais em si do que no “corpo de Cristo”.
 
2. “Não furtem; pelo contrário, dêem prova de toda a fidelidade, a fim de ornarem, em todas as coisas, a doutrina de Deus, nosso Salvador” (2.10). O apelo de Paulo é para que os líderes cristãos embelezem a verdade do evangelho com a prática das boas obras e da vivência real do “fruto do Espírito”. Adornamos a doutrina de Deus na medida em que o mundo, ao ver a forma como amamos e servimos e a unidade do povo de Deus, reconhecerá a verdade acerca de Jesus Cristo.
 
É isto que o historiador Eusébio de Cesaréia (265-339) afirma ao descrever o comportamento dos cristãos em meio a uma terrível peste. “Eles eram, efetivamente, os únicos que nesta circunstância calamitosa demonstravam com suas próprias obras, compaixão e o amor aos homens. Uns perseveravam todo dia no cuidado e no enterro dos mortos (pois eram milhares os que não tinham quem se ocupasse deles) e outros, reunindo num mesmo lugar a multidão dos que em toda a cidade estavam esgotados pela fome, repartiam pão para todos, de forma que o fato correu de boca em boca, e todos os homens glorificavam o Deus dos cristãos, e convencidos pelas próprias obras, confessavam que estes eram os únicos verdadeiramente piedosos e temerosos a Deus”.

 
Nota
Parte final do artigo baseado na preleção do autor feita no 1º Fórum da Aliança Evangélica no dia 24 de novembro de 2011, em Brasília (DF).

 
Leia mais
Pastor da Igreja Presbiteriana do Planalto e coordenador do Centro Cristão de Estudos, em Brasília (DF). É colunista da revista Ultimato e autor de A Espiritualidade, o Evangelho e a IgrejaPensamentos Transformados, Emoções RedimidasO Caminho do Coração.
  • Textos publicados: 54 [ver]

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU ATÉ AQUI.

Ultimato quer falar com você.

A cada dia, mais de dez mil usuários navegam pelo Portal Ultimato. Leem e compartilham gratuitamente dezenas de blogs e hotsites, além do acervo digital da revista Ultimato, centenas de estudos bíblicos, devocionais diárias de autores como John Stott, Eugene Peterson, C. S. Lewis, entre outros, além de artigos, notícias e serviços que são atualizados diariamente nas diferentes plataformas e redes sociais.

PARA CONTINUAR, precisamos do seu apoio. Compartilhe conosco um cafezinho.


Leia mais em Opinião

Opinião do leitor

Para comentar é necessário estar logado no site. Clique aqui para fazer o login ou o seu cadastro.
Escreva um artigo em resposta

Ainda não há artigos publicados na seção "Palavra do leitor" em resposta a este texto.