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Opinião

Convença-me, mas com respeito

São tempos difíceis, não só quanto à política e o que queremos para o país, mas que também afetam como nos relacionamos. Agimos mais como fanáticos torcedores de futebol que (supostamente) entendem bastante de política, sempre cheios de razão, detentores exclusivos da verdade. Para piorar, em épocas onde se abusa do nome de Deus, parece que abandonamos a ideia de tentar ser autênticos discípulos e discípulas de Jesus que buscam transformações, essas que começam em nós mesmos e que chegam a cada esfera da vida humana.

Uma das possíveis más reações diante do quadro obscuro em que vivemos é a do pessimismo, do ficar cético e azedo com a vida, com o país, com todo o mundo. Creio que muitos de nós temos experimentado isso. Situações conflitivas, incômodas, que se revelam também à mesa, na intimidade de nossos almoços de família em um domingo qualquer.

Se por um lado há a tentação de um pessimismo exacerbado, por outro aparece o caminho fácil de dividir as pessoas em categorias claras e simples. Manifesta-se assim: “se você pensa como eu e apoia a minha causa, à minha maneira, ou se votou no meu partido/candidato, então você é do bem; se você parece apoiar o ‘outro lado’, então você só pode ser ingênuo, mal informado ou mau caráter, quando não as três juntas".

O problema principal dessa postura seria que imaginamos poder sempre dividir o que passa no país e no mundo em termos de “bandidos” e “mocinhos”. Seria até bom e desejável se fácil assim fosse, mas, como já dizia Drexler, a vida (também a realidade) é mais complexa do que parece. Creio que só poderemos ambicionar fazer diferença no longo prazo se entendermos que simplificações e estereótipos não nos ajudarão.

Há um tempo preguei na igreja acerca de como Jesus fugiu das expectativas sobre com que tipo de pessoa ele deveria se juntar, ou a quem ele deveria abençoar e transformar. Examinamos juntos três breves, mas surpreendentes histórias: 1) o chamado de Levi, o publicano, para ser seu discípulo – em uma "péssima estratégia" de relações públicas; 2) seu encontro inesperado e restaurador com o chefe da gangue dos cobradores de impostos, Zaqueu – em uma aparente "concessão" de cair o queixo; 3) concluindo com o encontro de poucas palavras com uma mulher adúltera e sua turba acusadora – em uma forte denúncia à hipocrisia. Contra todas as expectativas dos religiosos da época, ele os confrontou e mostrou que inclusão, perdão e transformação eram possíveis.

Voltarei a essas três breves histórias em um próximo artigo. Por agora, lhes conto um dado curioso. Compartilhei essa mensagem no mesmo dia em que houve uma massiva manifestação contra a presidente eleita. Várias pessoas se acercaram para dizer-me que o sermão havia sido “corajoso”. À época fiquei bem curioso para entender essa reação. Corajoso contra (ou a favor de) quem? Não havia escolhido os textos por causa do momento político. Apenas seguia o planejamento previsto para as mensagens.

Talvez o pior (ou melhor, não sei bem dizer) é que só depois me dei conta que algumas afirmações que fiz poderiam sim ser interpretadas, de acordo com o ouvinte, como “apoio” ou “concessão” a algum grupo político, qualquer que fosse. Não o eram, pelo menos não de maneira intencional nem consciente. Hoje percebo que o mesmo sermão, caso outra vez pregado, poderia inclusive ser interpretado como “apoio” a algum grupo ou força política diferente da ocasião anterior. Um sinal da parcialidade de nossos ânimos?

Fico matutando sobre o que aprender disso e também em como lidar com as paixões dos debates irracionais que povoam as redes. Humildemente tenho sugerido: antes de supor saber em detalhes o que outro pensa, pergunte (com gentileza), converse (se possível, pessoalmente), respeite. Parece óbvio e simples, mas tão esquecido.

Sei que alguns dirão, e o dizem, que há horas para o diálogo e que em outros momentos são necessários resistência e luta. Entendo, e respeito. Mas alguns também defenderão que nem mesmo os meios importam, se os fins os justificam. Nesse ponto, divirjo. Pessoalmente, prefiro sempre estar do lado “perdedor” a utilizar um meio espúrio. Também prefiro resistir na paz, no diálogo, na persuasão e no convencimento, na formação de cidadãs e cidadãos que atuarão com consistência no longo prazo, e não só no calor das ondas políticas. Inclusive expressando claramente que estou aberto a ser convencido, através do diálogo respeitoso, admitindo a possibilidade bem plausível que eu esteja equivocado em minhas próprias convicções e caminhos. Algo como o personagem subterrâneo de Dostoievski: “destruí os meus desejos, apagai os meus ideais, mostrai-me algo melhor, e hei de vos seguir”.

Enquanto esse convencimento não acontece, aprecio o que o brilhante Jonathan Franzen afirmou sobre o “perigo” de relacionar-me com pessoas em lugar de caricaturas:

“Quando ficamos trancados em nossos quartos, bufando, caçoando ou nos sentindo indiferentes, como fiz durante tantos anos, o mundo e seus problemas parecem desafios impossíveis. Mas quando saímos às ruas e temos relacionamentos reais com seres reais (...) há o perigo bastante real de amarmos alguns deles. E então quem saberá dizer que rumo a vida tomará?”.

Pode ser que falar em “amar” a determinados tipos seja pedir demais. Deixo a Jesus essa ousadia. De minha parte desconfio que simplesmente sair de nossas redomas de certezas já funcione para uma grande maioria, quando uma simples mudança de atitude sirva para aumentar bastante a esperança de um mundo melhor, um onde não tenhamos tantos espasmos ou tropeços no meio de um longo caminho.

Foto: Diego Medrano / Freeimages.com

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É casado com Ruth e pai de Ana Júlia e Carolina. Integra o corpo pastoral da Igreja Metodista Livre da Saúde, em São Paulo (SP), serve globalmente como secretário adjunto para o engajamento com as Escrituras na IFES (International Fellowship of Evangelical Students) e também apoia a equipe da IFES América Latina.
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