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Opinião

Abuso sexual intrafamiliar e reconciliação entre familiares

Por Lucas Parisi
 
Por um conhecido programa de televisão veiculado aos domingos, foi apresentada uma reportagem sobre temas relacionados à alienação parental e à ‘pedofilia praticadas por pais’. A reportagem contou com relatos de mulheres que perderam a guarda dos filhos ao serem enquadradas na Lei de Alienação Parental (nº 12.318/10) após terem acusado os seus parceiros de abuso sexual dos filhos. Não precisa dizer que tal cenário é devastador para as famílias envolvidas e muitas são as emoções desencadeadas entre os seus membros. 
 
A noção de alienação dos filhos tem uma longa história de controvérsias, sobretudo, pela prática jurídica. Não há dúvida que o abuso é um problema real e comum aos relacionamentos em conflito, mas o conceito de alienação parental acabou se tornando um instrumento perigoso ao ser tomado como um dado pronto com o objetivo único de alimentar uma grande indústria de disputas judiciais. E o seu uso indiscriminado, sem a requerida responsabilidade, parece ter criado novas implicações com um debate em torno dos direitos das mães que alegam que a alienação parental se tornou um recurso imoral de custódia usado contra mães que tentam proteger a si e a seus filhos de pais hostis e abusivos. Este argumento, inclusive, apareceu na reportagem citada1.
 
Mas afinal, o que tem sido experimentado pelas famílias quando o assunto é alienação parental? Primeiro é preciso ressaltar que o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, contribuiu com um enorme avanço na área de proteção à criança ao afirmar que para denunciar um abuso de qualquer ordem psicológica, física ou sexual, basta apresentar uma suspeita de que o abuso tenha ocorrido, sem precisar de uma prova material. Mas o que é um avanço pode ser usado inapropriadamente no calor de uma emoção impensada ou no ímpeto de revanche entre adultos pressionados ou ofendidos.
 
No Brasil, a origem da alegação de Alienação Parental, advém da aprovação da lei da Guarda Compartilhada, lei nº 11.698/08. Esta lei instituiu e disciplinou essa modalidade de guarda no Código Civil. Posteriormente, a lei 13.058/14, referindo-se aos mesmos artigos do Código Civil, estabeleceu algumas regras para o funcionamento da guarda compartilhada como, por exemplo, a busca pela divisão igualitária do tempo de convívio do descendente com os genitores. E foi neste contexto que iniciaram os debates mais acalorados sobre o assunto. Pais e mães começaram a observar que os filhos retornavam dos seus períodos compartilhados com atitudes, comportamentos e sentimentos pouco amigáveis, hostis ou indiferentes a uma das partes. 
 
Por economia de espaço, não entrarei no debate em torno da chamada Síndrome de Alienação Parental (SAP). Registro apenas que A Síndrome de Alienação Parental se viu assumida no Brasil a partir da edição da Lei n. 12.318/10, tendo recebido aplausos com certo estranhamento da parte de grupos e profissionais de saúde mental. Corretamente, esses profissionais alegam que o termo é demasiadamente vago ao encobrir uma variedade de fenômenos clínicos, impedindo-o, acertadamente, de entrar para o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM como um transtorno específico. Tornando, dessa maneira, ilegítimo o diagnóstico e tratamento enquanto tal. Contudo, isso não nos permite deixar de fazer a pergunta: o que estamos dizendo então quando alegamos que uma criança sofre ou passa por alienação parental? 
 
O que a criança pode estar vivenciando é um abuso. Com toda as consequências de fenômenos clínicos possíveis a uma situação de abuso. E no caso da reportagem, ao contrário do que foi dito, o abuso sexual que um filho sofre no ambiente intrafamiliar é o incesto. E talvez a dificuldade pública em nomear adequadamente o incesto esteja justamente no assombro de pensar a remota possibilidade de haver pais e mães abusando sexualmente de seus filhos. Imagine ainda esse cenário em contextos de famílias cristãs. Estatísticas contabilizam que das 80.000 denúncias feitas ao disque 100 em 2017, 57% dos casos ocorreram em casa, mas sem diferenciação dos casos de incesto. E por que essa diferenciação seria importante? Porque em contexto clínico, verifica-se a existência de uma dinâmica particular que abrange na maioria das vezes toda a família tornando inadequada, por isso, a estigmatização desse tipo de abuso em termos simples de vítima e agressor.
 
E aos cristãos fica ainda um maior desafio e responsabilidade ao lidar com o assunto. Pois este é um conflito do campo das relações que nos são mais valorosas e formativas e, portanto, se o abuso se faz neste lugar, é neste lugar onde primeiro o problema deve ser pensado e tratado, tendo a reconciliação no campo de horizonte das soluções intencionadas por aqueles que entendem as relações em jogo. Essa reconciliação deve passar pelos termos, pelas crenças, pelas razões, pelos sentimentos, pelos afetos, pelos papéis de pais, mães e filhos e pelo lugar da família na experiência de cada um. Pretendendo um cuidado sincero com cada uma das partes. 
 
Um caminho saudável para a solução de conflitos dessa natureza nos é dado pelo próprio Deus através do ministério de reconciliação de Cristo (2 Coríntios 5: 18-21).  Para além dos aspectos jurídicos e do estabelecimento dos limites práticos entre ofendidos e ofensores, quando necessário, é importante chamar atenção para a natureza das relações envolvidas nos casos de incesto. É fácil? Não. Mas é possível. É importante. É necessário, pois, pesquisas sugerem que a maioria dos “pais/mães abusadores” tem em sua própria história experiências de abuso e de negligência, tanto na infância quanto na vida adulta. Acolher todos os envolvidos é oportunidade de se mitigar o início de um novo ciclo de abusos. E toda ajuda é necessária.
 
Nesse caminho de reconciliação é importante buscar uma rede de apoio e aconselhamento. Sem se esquecer do auxílio psicológico para uma ajuda sem o peso dos estigmas “abusado-abusador”. Diagnosticar corretamente e lidar francamente com o assunto ajuda a reestabelecer a saúde mental da infância e da família. E especificamente para o acolhimento de famílias incestuosas há dois serviços gratuitos no Brasil: o Ambulatório Especial de Acolhimento e Tratamento de Famílias Incestuosas (AMEFI HC/ UFMG)2 em Belo Horizonte e o Centro de Estudos e Atendimento Relativos ao Abuso Sexual (CEARAS USP)3 em São Paulo. É preciso proteger as crianças, inclusive, daquilo que também fazem a si e aos outros quando chegam à idade adulta.

Notas
1.
Pai abusador usa lei de alienação parental para tomar a guarda do filho
• Lucas Parisi é psicólogo clínico. Membro do Corpo Clínico do Ambulatório Especial de Acolhimento e Tratamento de Famílias Incestuosas no Hospital das Clínicas da UFMG (AMEFI HC-UFMG). Mora em Belo Horizonte e congrega na Igreja Esperança.
 
 

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