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Opinião

Crianças, adolescentes e o uso excessivo das telas

Um desafio para os pais “helicóptero” (que estão sempre rondando acima) e os pais “deixa a vida nos levar” (que são mais permissivos)

Por Ursula Regina Schmidt Affini

Alguns dias da semana eu trabalho em home office e meu filho adolescente fica comigo. Diversos sentimentos e pensamentos surgem em minha mente: Ele está realmente estudando enquanto fica no quarto? Será que está usando o celular? Deveria eu checar? Devo dar um voto de confiança e acreditar que ele está distante das telas conforme combinamos? Creio que não estou sozinha nestes questionamentos. Muitos pais e mães, educadores, entre outros que lidam com adolescentes, sentem esta mesma preocupação quanto ao uso e abuso das telas em geral. Observo que os pais se dividem em dois grupos: os pais “helicóptero” (que estão sempre rondando acima) e os pais “deixa a vida nos levar” (que, por terem crescido assistindo muita TV, não percebem problemas em deixar os filhos à vontade diante das telas). Parece-me que os dois grupos apresentam desafios; o primeiro pode dificultar o amadurecimento e o processo de autonomia emocional dos filhos, e o segundo pode colocá-los em situações de risco com as quais não estão prontos para lidar.

Até aqui, refiro-me à realidade dos adolescentes. Certamente a abordagem com crianças é diferente (falarei desta diferença adiante).

De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios realizada em 2021 pelo IBGE, a internet já é acessível em 90% dos domicílios brasileiros. Entre as pessoas com 10 anos ou mais de idade, os estudantes foram os que mais acessaram a internet (90,3%). Entre esses, os estudantes da rede privada (98,2%) têm mais acesso à internet do que os da rede pública (87%). A pesquisa revelou ainda que 95% dos estudantes utilizam a internet com o principal intuito de assistir a programas, filmes e séries. A segunda maior finalidade dos estudantes em navegar na rede é conversar por chamadas de voz ou vídeo (94,6%).

Para ampliar esta discussão, gostaria de trazer alguns autores para pensar no que seria uma relação de dependência com as telas, qual o efeito do uso excessivo de telas nas habilidades sociais dos adolescentes e qual a influência das telas no desenvolvimento, no que diz respeito a em memória de longo prazo e leitura profunda.

Este texto se fundamenta em uma visão sistêmica, que entende a relação do ser humano com diferentes pessoas, contextos, momentos e também consigo mesma. Dentro desta perspectiva, compreender a relação de crianças e adolescentes com as tecnologias digitais não pode ser um exercício isolado.

Até aqui, refletimos sobre a relação com o momento presente, bem como trouxe dados que nos ajudam a entender um pouco do que se tem percebido desta relação até aqui. Adiante pretendo pensar o que seria este sintoma chamado uso excessivo de tecnologia digital e para isso trago uma breve descrição do DSM 5 TR (Manual Diagnóstico de transtornos mentais) para pensarmos o que seria uma relação de comportamento excessivo com a tecnologia digital.

Considerando o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, há dois aspectos importantes quando se trata de uso excessivo de tecnologia digital. O primeiro se refere ao fato de que o tema transtornos de jogos e jogos em internet está no mesmo capítulo que descreve os transtornos por uso de substâncias, isto porque há evidências de que os comportamentos de jogo ativam sistemas de recompensa semelhantes aos ativados por drogas de abuso e ainda comportamentos comparáveis àqueles motivados pelo uso de substâncias. O segundo aspecto é que o transtorno de jogos em internet, apesar de estar descrito no manual, ainda não possui síndromes comportamentais claras.

Os transtornos relacionados a jogos envolvem de maneira resumida os seguintes critérios:
  • Comportamento de jogo que leva a sofrimento e prejuízo;
  • Inquietação ou irritabilidade ao tentar reduzir ou parar;
  • Repetidos esforços malsucedidos para controlar, reduzir ou parar;
  • Preocupação frequente em jogar;
  • Jogo quando há angústia;
  • Retorno ao jogo para se vingar depois de muitas perdas;
  • Mentira para ocultar o envolvimento com jogos;
  • Perda ou prejuízo de relacionamentos significativos ou oportunidades educacionais por causa do jogo.

Em linhas gerais podemos perceber caminhos nos estudos citados acima para compreender quando o uso de eletrônicos ultrapassa o limite do que seria um uso saudável e adaptado à realidade da criança e do adolescente para se tornar nocivo. Quando o uso de tecnologia interfere nas notas escolares, na relação com amigos, no humor, possivelmente houve excesso. Gostaria ainda de acrescentar duas observações, a primeira é que para perceber estas nuances do comportamento dos adolescentes e crianças precisamos ter proximidade com eles e considerar o contexto, ou seja, irritabilidade pode também indicar fome, cansaço, necessidade de um tempo de qualidade, tristeza, ou ainda um problema familiar ou na escola. Mudanças advindas da transição da infância para a adolescência, por exemplo, com as alterações hormonais e de comportamento, também devem ser consideradas. Em termos de funcionamento da mente, podemos especificar um pouco mais e fazer algumas considerações.

Já falamos em linhas gerais sobre responsáveis, crianças e adolescentes, mas gostaria de lembrar de forma específica que o uso excessivo de telas por crianças e adolescentes também pode ter relação com fatores familiares. Por isso, fatores de proteção são importantes.

No livro Dependência de internet em crianças e adolescentes, Kimberly Young e Crisitiano Nabuco1 oferecem diversos estudos para embasar a relação entre famílias e uso excessivo de telas e elencam alguns fatores de risco:
  • Insatisfação familiar;
  • Problemas na comunicação;
  • Falta de monitoramento parental participativo e solidário no início da adolescência;
  • Percepção de pais excessivamente controladores nos anos finais da adolescência;
  • Estilos parentais com falta de afeição emocional, rejeição, punição, ou com envolvimento excessivo;
  • Má qualidade na relação entre pai/mãe (tanto casados como separados);
  • Má qualidade na relação entre pais/filhos, mães/filhas;
  • Uso excessivo de álcool de pai e/ou mãe;
  • Efeito da saúde mental dos pais, especialmente transtorno de humor deprimido.

A partir desses fatores de risco, podemos pensar que o oposto é importante fator de proteção: relações familiares em que haja comunicação, conhecimento dos processos da infância e da adolescência e flexibilidade para adaptação a cada fase com mudança no estilo parental, desenvolvimento de saúde mental, qualidade de vida, investimento em relacionamento, descanso, atividade física. Sugiro ainda a participação em rodas de conversa em que seja possível compartilhar as angústias, experiências, entre outros desafios de viver neste momento atual.

Sugestões para uso de telas entre crianças e adolescentes
No Manual de Orientação Saúde de Crianças e Adolescentes na Era Digital 20162, a Sociedade Brasileira de Pediatria faz recomendações relacionadas ao tempo diário de uso das telas, exposição a conteúdo inapropriado, mediação do uso das telas por adultos, diálogo sobre as regras de uso da internet, monitoramento de programas, aplicativos, filmes, vídeos, conversa sobre valores familiares, respeito, tolerância, entre outras iniciativas para proteção das crianças e dos adolescentes.
  • Limitar o tempo de uso diário proporcional às idades e às etapas do desenvolvimento cerebral-mental-cognitivo-psicossocial das crianças e adolescentes.
  • Desencorajar, evitar e até proibir a exposição passiva e frente às telas digitais, com exposição a conteúdos inapropriados em filmes e vídeos, para crianças com menos de dois anos, principalmente, durante as refeições ou de uma a duas horas antes de dormir.
  • Limitar o tempo de exposição as mídias a 1 hora por dia para crianças entre 2 a 5 anos. Crianças entre 0 e 10 anos não devem fazer uso de televisão ou computador nos seus próprios quartos. Estimular atividade física diária por uma hora.
  • Crianças menores de 6 anos precisam ser mais protegidas da violência virtual, pois não conseguem separar fantasia da realidade.
  • Mediar o uso com a presença dos pais para ajudar na compreensão das imagens. Equilibrar horas de jogos online com atividades esportivas, brincadeiras e contato direto com a natureza.
  • Conversar sobre as regras do uso da internet, privacidade e sobre compartilhar senhas, fotos ou informações pessoais. Conversar também sobre exposição através de webcam com pessoas desconhecidas e sobre postagem de fotos íntimas, mesmo com pessoas conhecidas.
  • Monitorar sites, programas, aplicativos, filmes, vídeos acessados por crianças e adolescentes.
  • Usar programas que restringem tempo de uso de jogos online e uso de aplicativos. Conversar com calma, sem amedrontar crianças e adolescentes, sobre perigos que existem na internet e onde nem tudo é o que parece ser.
  • Conversar sobre valores familiares e regras de proteção social para o uso saudável, crítico, construtivo e pró-social das tecnologias valorizando a ética de não postar qualquer mensagem de desrespeito, discriminação, intolerância ou ódio.
  • Desconectar. Dialogar. Aproveitar as oportunidades aos finais de semana e durante as férias para conviver com a família e amigos, e dividir momentos de prazer sem o uso da tecnologia, mas com afeto e alegria.

Jane Nelsen e Lynn Lott (2019)3 fazem as seguintes sugestões para criação de regras para adolescentes quanto ao uso de telas:
  • Dê aos filhos escolhas limitadas sobre quanto tempo ou quando podem usar as mídias, por exemplo um tempo durante a semana e um tempo durante o final de semana.
  • Decidam juntos sobre a criação de um “estacionamento” noturno para todos os eletrônicos a partir de determinado horário a ser definido (por exemplo, das 22 às 6 horas).
  • Converse com seus filhos sobre o que eles estão assistindo, fazendo ou jogando.
  • Não gaste uma fortuna com jogos de computador. Combine com seus filhos que eles devem pagar por estas coisas.
  • Dê o exemplo e não fique grudado em dispositivos eletrônicos.
  • Se houver sites fora dos limites, mostre sua opinião sobre isso. Ouça a opinião deles. Negocie se necessário.
  • Se alguns sites, programas ou jogos forem questionáveis, programe-se para quando puder sentar-se ao lado dos seus filhos e usá-los em conjunto para que você possa ter um diálogo sobre eles.
  • Informe seus filhos que, se você achar que eles estão se viciando, você irá proibir o tempo de mídia até que eles sejam capazes de fazer um uso saudável.
  • Crie zonas livres de mídia. Um dia por semana, ou um dia por mês sem mídia. Nenhuma mídia durante as refeições.

É possível pensar em regras que estejam de acordo com os valores familiares sem ser muito proibitivo, o que pode estimular adolescentes e crianças a desejarem e buscarem o que é proibido. Para os pais que são permissivos em excesso, vale lembrar que ao não estipular regras podemos conceder um atestado secreto de incompetência aos nossos filhos, sinalizando que acreditamos que eles não possam fazer melhor e incentivando-os a agir de acordo com essa mensagem. O caminho é complexo e desafiador, principalmente pela falta de respaldo de legislação governamental e nas escolas que nos auxiliem no relacionamento com crianças e adolescentes e na orientação do uso de telas de forma que eles se beneficiem da tecnologia e sejam guardados de seus malefícios.

Por enquanto cabe a nós, adultos, ajudar crianças e adolescentes a desenvolver uma consciência crítica daquilo que leem, assistem e ouvem, considerando suas capacidades de desenvolvimento. E que possamos nos comprometer mais com a reflexão sobre o assunto e dar o bom exemplo – que fala mais do que muitos discursos.

Que na busca por lares construídos com sabedoria, consolidados com discernimento e com cômodos cheios do que é precioso e agradável por meio do conhecimento (Pv 24.3-4), possamos buscar o caminho do equilíbrio e da consciência crítica, fundamentados na certeza do amor e da verdade que vieram por meio de Jesus Cristo (Jo 1.17).

Notas
1. Young, Kimberly e Abreum Cristiano Nabuco. Dependência de internet em crianças e adolescentes. Porto Alegre: Artmed Panamericana Editora, 2017.
2. Departamento de Adolescência Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Manual de Orientação Saúde de Crianças e Adolescentes na Era Digital 2016. Disponível
aqui.
3. Nelsen, Jane e Lott, Lynn. Disciplina positive para adolescents: uma abordagem gentil e firme na educação dos filhos. São Paulo: Manole, 2019.

  • Ursula Regina Schmidt Affini, mãe de Gustavo e de Davi, é psicóloga clínica e mestre em psicologia e professora no curso de Terapia Familiar da EIRENE do Brasil.
Versão ampliada do artigo O uso e o abuso das telas por crianças e adolescentes publicado na edição 404 de Ultimato.
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