Opinião
22 de janeiro de 2025
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Confrontando a divisão: buscando a unidade por meio do Espírito
É hora de restaurarmos a arte perdida das discussões da igreja
Por Anne Zaki
O artigo a seguir é a transcrição e tradução da exposição bíblica feita pela teóloga Anne Zaki no 4º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial.
Bom dia a todos vocês!
Trago o amor de seus irmãos e irmãs em Cristo do Egito, do Norte da África e do Oriente Médio.
Há aproximadamente 15 a 20 milhões de nós na região e muitos milhões a mais de comunidades de adoração, de língua árabe, ao redor do mundo. Pela graça de Deus, a igreja no Oriente Médio tem tido uma presença ininterrupta desde o dia de Pentecostes, apesar de tudo que se passa em nossa região. E contamos com suas orações para que a graça de Deus continue a nos sustentar enquanto alcançamos nossos vizinhos não crentes com o amor e a paz de Jesus Cristo.
Esta manhã, é uma honra e um prazer refletir sobre a palavra de Deus juntos, conforme ela chega até nós no capítulo 15 do livro de Atos. Quero começar mencionando um filme recente que talvez alguns de vocês tenham assistido. Remando para o ouro conta a história real de oito jovens atletas da equipe de remo da Universidade de Washington. No início, há um diálogo entre os treinadores, que estão claramente frustrados por não conseguirem fazer os oito atletas trabalharem juntos como um time. Todos eram fortes, mas não sabiam usar seus pontos fortes para lutarem juntos, em vez de lutarem entre si. Um dos treinadores diz: “Este é o grupo mais forte que já vimos, mas também pode ser a equipe mais fraca que já tivemos”.
Depois da leitura desta manhã da passagem em Atos, que foi lindamente feita pela nossa equipe de drama, poderíamos descrever a Igreja de Antioquia (At 15.1-5) com as mesmas palavras do treinador – ela estava usando sua força para lutar uns contra os outros, em vez de lutarem juntos.
Ouça o que aconteceu em Antioquia. Enquanto Paulo e Barnabé estavam lá, por um longo tempo, discipulando a jovem igreja de Antioquia, que haviam plantado juntos, eles ficaram profundamente perturbados com o ensinamento de alguns homens vindos da Judeia: “Se vocês não forem circuncidados segundo o costume de Moisés, não podem ser salvos” (v. 1). Isso colocava em dúvida a morte e ressurreição de Jesus como única garantia de salvação, e ameaçava a unidade que o Espírito Santo já havia criado entre crentes judeus e gentios.
Após disputa e debate acirrados com aqueles homens da Judeia, a igreja reconheceu que tal falso ensino poderia alcançar outras igrejas e comissionou Paulo e Barnabé, junto com outros crentes, para irem até Jerusalém discutir essa importante questão com os apóstolos e presbíteros.
Agora, quero que você observe o engajamento de crentes regulares junto dos líderes da igreja na discussão das principais questões teológicas da igreja naquela época. Vemos o primeiro concílio da igreja na história: uma reunião entre apóstolos, presbíteros e crentes engajados, incluindo alguns que tinham opiniões opostas. Porque quando eles chegaram a Jerusalém, descobrimos que parte do concílio era o partido dos fariseus, que se levantaram e ecoaram os mesmos ensinamentos que os falsos mestres estavam dizendo em Antioquia: “Os gentios devem ser circuncidados e obrigados a obedecer à lei de Moisés”. Ainda assim, eles permaneceram até o final e discutiram juntos o assunto.
Então, o versículo 7 declara: “Havendo grande debate, Pedro tomou a palavra e disse”. Isso é notável por, pelo menos, duas razões. Primeiro, porque demonstra a coragem da liderança exemplificada por Pedro. Coragem de sair da arquibancada silenciosa do espectador (em que, infelizmente, muitos líderes da igreja permanecem em tempos de conflito e crise) e arriscar-se pelo bem de seus parceiros no evangelho, Paulo e Barnabé — ainda mais pelo bem da verdade, que o próprio Pedro aprendeu de forma dolorosa, quando foi confrontado por Paulo, o que nos leva à segunda razão pela qual isso é notável.
Lembre-se de que pouco antes deste concílio em Jerusalém, Pedro estava visitando Antioquia quando Paulo o confrontou sobre seu comportamento hipócrita, e mais tarde Paulo escreveu sobre isso no capítulo dois de sua carta aos Gálatas. Ele escreveu isto: “Quando, porém, Cefas veio a Antioquia, resisti-lhe francamente, porque era censurável. Pois, antes de chegarem alguns homens da parte de Tiago, ele comia com os pagãos convertidos. Mas, quando aqueles vieram, retraiu-se e separou-se destes, temendo os circuncidados. Os demais judeus convertidos seguiram-lhe a atitude equívoca, de maneira que mesmo Barnabé foi levado por eles a essa dissimulação”.
No Concílio de Jerusalém, encontramos um Pedro mudado, corrigido, conquistado por seu irmão Paulo após um confronto bem-sucedido, de acordo com o ensinamento de Jesus em Mateus 18 (cf. Gl 2.11-21). Talvez a coragem que Pedro demonstrou ao falar em Jerusalém tenha se inspirado na coragem de Paulo ao falar com ele em Antioquia.
Mas, e se Paulo nunca tivesse confrontado Pedro? O que teria acontecido com a fé de Barnabé e dos outros crentes de Antioquia? E se Pedro nunca tivesse sido corrigido e, consequentemente, nunca tivesse falado no Concílio de Jerusalém? O que teria acontecido com a unidade e a missão da igreja naquela época, e que tipo de teologia da igreja teríamos herdado?
E então eu faço essa pergunta aos nossos líderes da igreja hoje. O que acontece quando encobrimos o comportamento errado dos nossos colíderes? Ou quando falhamos em confrontar corajosamente os ensinamentos errados sobre o que é necessário para a salvação? Por exemplo, falsos ensinamentos de que a salvação pode ser conquistada por meio de boas ações, ou por meio do desprezo pelo próprio corpo. O que acontece quando os líderes da igreja ficam em silêncio diante de ensinamentos errados em vez de confrontar os guardiões polarizadores que dividem os crentes?
Não tanto de judeus e gentios, embora isso ainda aconteça hoje, mas mais de jovens e velhos, ricos e pobres, homens e mulheres, educados e analfabetos, deficientes e fisicamente aptos, pessoas nascidas em lares de crentes e crentes forçados a sair de seus lares para crer. Quando ficamos em silêncio em momentos de dizer a verdade, o futuro da igreja está em jogo. Mas também devemos admitir que quebrar o silêncio nos traz um alto custo.
Quando Jesus confrontou a hipocrisia e os falsos ensinamentos dos líderes religiosos de sua época, isso lhe custou a vida, e tem custado a vida de seus seguidores desde então. Às vezes fisicamente, na maioria das vezes psicologicamente.
Acredito que, um dia, toda a comunidade missional terá que pagar um preço não importa o que aconteça. A questão é: Será o custo de ficar em silêncio e deixar que os falsos ensinamentos nos dividam? Ou será o custo de quebrar o silêncio e ensinar os verdadeiros ensinamentos que deveriam nos unir? Pedro quebrou o silêncio e lembrou ao Concílio como Deus evidenciou sua aceitação pelos gentios, dando-lhes o Espírito Santo, assim como tinha dado aos judeus.
Agora, todos nós sabemos que quando lemos nos Evangelhos os ensinamentos de Jesus, sabemos que Jesus fez algumas distinções bem claras, como distinções entre luz e escuridão, santidade e hipocrisia, a porta estreita e a porta larga. E como igreja, faríamos muito bem em traçar as linhas divisórias onde Jesus as havia traçado.
Mas em sua igreja, Jesus não fez distinção entre nós e eles. Judeus e gentios, liberais e conservadores, modernos e tradicionais, complementaristas e igualitários, missionários estrangeiros e líderes indígenas. Ele não fez distinção entre pessoas pertencentes a várias raças ou afiliações políticas, desde que tenham sido batizadas em Cristo e se revestiram de Cristo, pois em Cristo somos todos um. Não divida o que Jesus uniu, não faça distinções onde Jesus não fez nenhuma.
Pedro conclui seu discurso com esta poderosa pergunta profética: “Agora, pois, por que vocês querem tentar a Deus, pondo sobre o pescoço dos discípulos um jugo que nem os nossos pais puderam suportar, nem nós?” (v. 10). Para Pedro, o tipo de distinção que resulta em “nós versus eles” eleva-se a ponto de tentar a Deus.
Em outro lugar no Novo Testamento, Tiago escreveu: “Mas, se tendes no coração um ciúme amargo e gosto pelas contendas, não vos glorieis, nem mintais contra a verdade”. Tiago está alertando contra aqueles que justificam a visão com base em motivos errados e ainda fingem ser defensores da verdade. Ele está dizendo “vocês estão realmente traindo a verdade”. Distorcer as palavras de Deus, de forma a dividir o seu povo e obstruir sua missão, é um ato de traição. E o próprio Pedro responde à sua pergunta: “Cremos que somos salvos pela graça do Senhor Jesus, assim como eles” (v. 11).
Depois dessa afirmação teológica fundamental, Paulo e Barnabé têm a chance de demonstrar essa verdade compartilhando os sinais e maravilhas que Deus tem feito entre os gentios por meio deles. E então somos informados de que toda a assembleia fica em silêncio. Mas veja, esse é um tipo diferente de silêncio. Este não um silêncio de espectador, sobre o qual falamos antes, um silêncio descomprometido, que encobre os erros dos outros ou de si mesmos. Nem um silêncio temeroso, que não é “confrontacional”. Nem ainda um silêncio oprimido, que se rende à injustiça. Não. Este é um silêncio convicto, rendido à voz do Espírito Santo. Um silêncio que reorienta uma comunidade missional para declarar e mostrar livremente a verdade de Cristo.
“Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós”
Tendo ouvido as discussões teológicas que estavam acontecendo no conselho e os relatos que vieram dos campos missionários por meio de Paulo, Barnabé e Pedro, Tiago enquadra toda a discussão dentro do testemunho das Escrituras. Ele primeiro recita uma profecia do profeta Amós a fim de ajudar o Concílio a interpretar suas experiências atuais corretamente, assim como essas experiências testificam o cumprimento da profecia: “Depois disso, voltarei e reedificarei o tabernáculo caído de Davi; reedificarei as suas ruínas e o restaurarei. Para que o restante da humanidade busque o Senhor, juntamente com todos os gentios sobre os quais tem sido invocado o meu nome, diz o Senhor” (v. 16-18). Em seguida, compartilha sua opinião como um entre iguais e diz: “Por isso, julgo que não devemos perturbar aqueles que, entre os gentios, se convertem a Deus” (v. 19). E sugere que escrevam uma carta explicando que pareceu bem ao Espírito Santo e a eles não sobrecarregá-los com nada.
Nós amamos a frase “pareceu bem ao Espírito Santo e a nós” (v. 28), não é mesmo? É uma das dez citações favoritas da igreja primitiva. Mas será que entendemos o processo pelo qual a igreja primitiva chegou a tal declaração? Foi um processo de falar uns com os outros – não uns para os outros ou uns sobre os outros. Foi um processo que levou horas de disputas e debates em Antioquia, seguido por longas horas de discussão em Jerusalém entre pessoas que tinham visões opostas sobre o mesmo assunto.
Imagine quanto tempo, esforço e dinheiro teriam sido economizados se os falsos mestres em Antioquia tivessem apenas escutado e se retratado. Imagine se Paulo e Barnabé não tivessem precisado interromper seu ministério, deixá-lo para trás e sofrer uma longa jornada de Antioquia a Jerusalém, e de volta a Antioquia para resolver essa questão mais básica sobre a salvação.
Mas honestamente, sou grata que as coisas aconteceram do jeito que aconteceram porque isso nos mostra que a igreja primitiva era real, não muito diferente da igreja hoje. Por tudo o que o Espírito Santo fez nos apóstolos e por meio deles naquela época. A igreja ainda precisava decifrar questões teológicas em uma reunião com pessoas que tinham visões opostas sobre o mesmo assunto. Esse incidente mostra o preço e o processo pelo qual chegamos a uma declaração do tipo: “Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós”. Uma declaração nascida da oração diária, do compromisso com o ensino da Palavra, do partilhar do pão e de uma generosidade notável. Uma declaração que preserva a voz da igreja e é reservada para a voz da igreja, de toda a igreja junta, incluindo pessoas que têm visões opostas. Não é uma declaração de um único líder que, depois de um retiro pessoal, voltar com decisões para a igreja e dizer: “Pareceu bem ao Espírito Santo e a mim”. Esse líder da igreja não somos nós. A igreja junta somos nós. Também não é uma declaração de um determinado grupo de líderes, motivado por finanças, poder ou status com base em finanças, que justificam marginalizar outros crentes sob o pretexto de “pareceu bem ao Espírito Santo e a nós”. Este grupo de líderes da igreja também não somos nós. A igreja unida somos nós. É hora de restaurarmos a arte perdida das discussões da igreja. A arte de falar e ouvir uns aos outros. Mesmo para aqueles que se opõem às nossas visões sobre como interpretar a Bíblia, ou como adorar, ou quem deve liderar na igreja, ou qual país abençoar e qual nação amaldiçoar. É hora de aprendermos com a igreja primitiva a disciplina de criar espaços seguros – para nos dar uma chance, para reconsiderar nossas posições presumidas à luz do que está em jogo, ou seja, a unidade e a missão da comunidade de Deus.
Você já ouviu isso antes, na unidade essencial, na liberdade não essencial, em todas as coisas, caridade e amor. Paulo fala em sua carta aos filipensessobre esse tipo de caridade, esse tipo de amor como o oxigênio que a igreja precisa para respirar. Quando ele orou para que o amor deles abundasse mais e mais em conhecimento e em profundidade de percepção para que pudessem discernir o que é melhor.
Paulo está dizendo: “Pratiquem o discernimento juntos. Não se concentrem em coisas menores ou vocês falharão nas principais prioridades da sua missão”. Parte do discernimento é reconhecer a urgência do nosso chamado. A igreja primitiva realmente acreditava que Jesus voltaria em breve, que a colheita era abundante, que os trabalhadores eram poucos e que a Grande Comissão não poderia ser cumprida com apenas uma parte dela. Todos eram necessários. Precisou aprender rapidamente como se tornar uma equipe forte, lutando juntos em vez de uns contra os outros.
De volta ao filme Remando para o ouro, a conversa entre os treinadores continou enquanto eles perguntavam como fazer esses oito atletas atingirem seu máximo potencial como uma equipe unificada? Talvez, o problema não estivesse nos atletas, mas em ter o timoneiro certo. O timoneiro é a nona pessoa no barco, essencial para o sucesso da equipe. Enquanto os oito atletas remam voltados para trás, o timoneiro é posicionado para a frente, sendo a única pessoa qualificada para definir a direção e o ritmo do barco. Ele é o único capaz de deixar os atletas saberem onde estão na corrida e o que é necessário para vencê-la. E então os treinadores colocaram um novo timoneiro neste barco, que passou longas horas treinando cada vez mais esses oito atletas para remar, não como se estivessem em uma única corrida, mas para remar como uma equipe.
O Espírito Santo é o timoneiro do barco, que é a igreja. Por ser onipotente, é o único qualificado para definir a direção e o ritmo de como melhor terminar a corrida, ao trazer clareza e unidade aos egos humilhados que estão dispostos a serem transformados e reformados continuamente por Deus.
Concessões de cá e de lá
A carta de Jerusalém declara quatro requisitos: abstenção de alimentos sacrificados a ídolos, de sangue, da carne de animais estrangulados e da imoralidade sexual (v. 29). Por quê? O Concílio não havia concordado em não sobrecarregá-los? Os gentios não estavam agora livres em Cristo? Sim, a liberdade deles havia sido conquistada por Cristo. Mas precisava ser uma liberdade responsável, atenciosa para com os crentes mais fracos. Tiago viu na ausência desses requisitos uma ameaça à unidade e ao testemunho da igreja. Ele viu uma ameaça à unidade da igreja. Acho que foi sensato que, assim como o Concílio esperava que os crentes judeus fizessem uma concessão sobre a exigência da circuncisão, esperava também que os crentes gentios fizessem concessões sobre essas quatro exigências, a fim de manter a unidade por meio do vínculo da paz.
Os crentes judeus têm ouvido sobre essas exigências em todas as cidades desde os primeiros tempos e já alinharam suas vidas diárias de acordo com essas exigências. Portanto, eles podem achar essas quatro práticas terríveis se praticadas por seus companheiros crentes gentios e talvez sejam desviados pela ofensa contínua.
O Concílio em Jerusalém sabia que o Espírito Santo fez a igreja uma, mas reconhecia que essa unidade estava em construção. Para alcançar a unidade, todos os membros deveriam considerar não apenas seus próprios interesses, mas também os interesses dos outros.
Tiago estava preocupado também com o testemunho da igreja perante seus vizinhos não crentes. O cerne da missão, conforme declarado na profecia de Amós, era que o restante do povo pudesse buscar o Senhor. Portanto, a igreja em Antioquia precisava remover quaisquer pedras que estivessem no caminho dos não crentes em direção à fé e à salvação. Afinal, o que os separaria como seguidores de Cristo se continuassem a comer carne sacrificada a ídolos e se envolvessem em imoralidade sexual?
O ser da Igreja é em si uma missão. Isso então levanta a questão: que exigências devemos colocar sobre nós mesmos em nossa liberdade em Cristo para remover todos os obstáculos do caminho de nossos vizinhos não crentes? Do que devemos nos abster em pensamentos, palavras, ações e relacionamentos para manter a comunhão com nossos irmãos e irmãs crentes, sem comprometer a verdade do evangelho? Em um congresso como o Lausanne 4, podemos chegar a respostas que se aplicam à igreja global, mas também é importante chegar a respostas que sejam contextualizadas aos nossos cenários culturais e missionários únicos.
Correção, alegria, consolo e paz
John Stott disse uma vez: “O maior obstáculo ao avanço do evangelho em todo o mundo é a falha do povo de Deus em viver como povo de Deus”. Continuando em Atos 15, lemos que, quando a igreja de Antioquia se reuniu e leu a carta enviada pela igreja de Jerusalém, todos ficaram contentes e consolados (v. 31). Aquele poderia ter sido um momento tenso, todos esperando o que as vozes de Jerusalém diriam e qual lado eles defenderiam. Mas o Espírito Santo trouxe alegria e consolo quando a paz da igreja foi restaurada e a ameaça à unidade foi removida.
O Espírito Santo continua a nos oferecer a mesma alegria e consolação hoje. Quando a verdade substitui nosso silêncio temeroso, a unidade é restaurada e somos liberados para retomar pacificamente nossa missão como igreja. É então que podemos declarar e mostrar o cumprimento da oração de Jesus: “A fim de que todos sejam um. E como tu, ó Pai, estás em mim e eu em ti, também eles estejam em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste” (Jo 17.21).
Hoje, é preciso ouvir de novo essas boas novas. A Trindade está investida em nossa unidade como uma comunidade missional. O Pai, o Filho e o Espírito Santo guiam a igreja e definem sua direção e seu ritmo rumo à verdade e unidade, que então produzem o fruto da paz e da justiça. Somos testemunhas da missão pacífica e justa da Trindade em tempos de crise na e por meio da igreja na África do Sul, em Ruanda, no Egito. E hoje oramos para que em breve testemunhemos a missão pacífica e justa da Trindade na e por meio da igreja nas crises em curso na Ucrânia, no Sudão e em Gaza.
Afinal, os oito atletas de Remando para o ouro aprendem a trabalhar juntos. Vencem, apesar de tudo, e se classificam para competir nas Olimpíadas de 1936 em Berlim. Pouco antes da competição, seu treinador dá a eles um último discurso motivacional: “Remem pelo seu país. Remem uns pelos outros. Remem por aquele momento em que tudo o que está contra vocês pode ficar em segundo plano”. E foi isso que eles fizeram. Eles remaram desimpedidos a ponto de enfrentarem os maiores rivais e conquistam o ouro olímpico.
E assim fez também a igreja primitiva. Eles descobriram maneiras de ouvir uns aos outros, de se unirem, apesar de suas diferenças, e seguiram adiante em sua missão desimpedidos – que é a última palavra no livro de Atos na versão grega.. Os seguidores de Cristo e seu evangelho continuaram a superar todos os obstáculos e todas as divisões. E sabemos que um dia, pela graça de Deus, as palavras de 1 João 4.4 finalmente serão verdadeiras: “Filhinhos, vocês são de Deus e venceram os falsos profetas, porque aquele que está em vocês é maior do que aquele que está no mundo”. Por causa dessa verdade, descansamos e nos alegramos. A Igreja de Cristo sempre será invicta.
Na última cena do filme, há uma conversa que acontece anos depois, entre um dos oito atletas e seu netinho: “Vovô, você gostou de remar em uma equipe de oito homens?”, ao que o avô responde: “Oito? Nunca fomos oito. Éramos um”.
Irmãos e irmãs em Cristo, Jesus orou: “Eu quero que eles sejam um”. Irmãos e irmãs em Cristo, nós somos um.
Você poderia orar comigo?
“Santo Jesus, nós te agradecemos por nos fazer um. Perdoa-nos pelas vezes em que quebramos essa unidade. Dá-nos o poder, a graça e a humildade para reconstruir a unidade para a qual nos criaste. Vem agora, Senhor Jesus, faz de nós um. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém”.
Transcrito e traduzido por Ana Laura Morais.
REVISTA ULTIMATO – LAUSANNE – QUE A IGREJA ANUNCIE E DEMONS-TRE CRISTO EM UNIDADE
“Que a Igreja anuncie e demostre Cristo, unida” é o tema do 4º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial realizado em setembro de 2024 na Coreia do Sul, e registrado por Ultimato numa ampla matéria de capa.
Colaboraram com esta edição líderes, missionários, pastores que participaram do evento e que prosseguem trabalhando em favor do cumprimento da Grande Comissão.
É disso que trata a matéria de capa da edição 411 da revista Ultimato. Para assinar, clique aqui.
Saiba mais:
» A Igreja – Uma comunidade singular de pessoas, John Stott e Tim Chester
» Unidade da Igreja e Cooperação na Missão, Leandro Silva (org.)
» Para que todos sejam um – A unidade da igreja é possível?, edição 397 de Ultimato
» A Declaraçaõ de Seul - 4º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial
» Olhando para frente, por Sabrina Barroso Silva Lujić e Justin A. Schell, 4º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial
» Descobrindo o potencial da diáspora: um chamado à igreja brasileira, por Fabiana Braun, 4º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial
Por Anne Zaki
O artigo a seguir é a transcrição e tradução da exposição bíblica feita pela teóloga Anne Zaki no 4º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial.

Trago o amor de seus irmãos e irmãs em Cristo do Egito, do Norte da África e do Oriente Médio.
Há aproximadamente 15 a 20 milhões de nós na região e muitos milhões a mais de comunidades de adoração, de língua árabe, ao redor do mundo. Pela graça de Deus, a igreja no Oriente Médio tem tido uma presença ininterrupta desde o dia de Pentecostes, apesar de tudo que se passa em nossa região. E contamos com suas orações para que a graça de Deus continue a nos sustentar enquanto alcançamos nossos vizinhos não crentes com o amor e a paz de Jesus Cristo.
Esta manhã, é uma honra e um prazer refletir sobre a palavra de Deus juntos, conforme ela chega até nós no capítulo 15 do livro de Atos. Quero começar mencionando um filme recente que talvez alguns de vocês tenham assistido. Remando para o ouro conta a história real de oito jovens atletas da equipe de remo da Universidade de Washington. No início, há um diálogo entre os treinadores, que estão claramente frustrados por não conseguirem fazer os oito atletas trabalharem juntos como um time. Todos eram fortes, mas não sabiam usar seus pontos fortes para lutarem juntos, em vez de lutarem entre si. Um dos treinadores diz: “Este é o grupo mais forte que já vimos, mas também pode ser a equipe mais fraca que já tivemos”.
Depois da leitura desta manhã da passagem em Atos, que foi lindamente feita pela nossa equipe de drama, poderíamos descrever a Igreja de Antioquia (At 15.1-5) com as mesmas palavras do treinador – ela estava usando sua força para lutar uns contra os outros, em vez de lutarem juntos.
Ouça o que aconteceu em Antioquia. Enquanto Paulo e Barnabé estavam lá, por um longo tempo, discipulando a jovem igreja de Antioquia, que haviam plantado juntos, eles ficaram profundamente perturbados com o ensinamento de alguns homens vindos da Judeia: “Se vocês não forem circuncidados segundo o costume de Moisés, não podem ser salvos” (v. 1). Isso colocava em dúvida a morte e ressurreição de Jesus como única garantia de salvação, e ameaçava a unidade que o Espírito Santo já havia criado entre crentes judeus e gentios.
Após disputa e debate acirrados com aqueles homens da Judeia, a igreja reconheceu que tal falso ensino poderia alcançar outras igrejas e comissionou Paulo e Barnabé, junto com outros crentes, para irem até Jerusalém discutir essa importante questão com os apóstolos e presbíteros.
Agora, quero que você observe o engajamento de crentes regulares junto dos líderes da igreja na discussão das principais questões teológicas da igreja naquela época. Vemos o primeiro concílio da igreja na história: uma reunião entre apóstolos, presbíteros e crentes engajados, incluindo alguns que tinham opiniões opostas. Porque quando eles chegaram a Jerusalém, descobrimos que parte do concílio era o partido dos fariseus, que se levantaram e ecoaram os mesmos ensinamentos que os falsos mestres estavam dizendo em Antioquia: “Os gentios devem ser circuncidados e obrigados a obedecer à lei de Moisés”. Ainda assim, eles permaneceram até o final e discutiram juntos o assunto.
Então, o versículo 7 declara: “Havendo grande debate, Pedro tomou a palavra e disse”. Isso é notável por, pelo menos, duas razões. Primeiro, porque demonstra a coragem da liderança exemplificada por Pedro. Coragem de sair da arquibancada silenciosa do espectador (em que, infelizmente, muitos líderes da igreja permanecem em tempos de conflito e crise) e arriscar-se pelo bem de seus parceiros no evangelho, Paulo e Barnabé — ainda mais pelo bem da verdade, que o próprio Pedro aprendeu de forma dolorosa, quando foi confrontado por Paulo, o que nos leva à segunda razão pela qual isso é notável.
Lembre-se de que pouco antes deste concílio em Jerusalém, Pedro estava visitando Antioquia quando Paulo o confrontou sobre seu comportamento hipócrita, e mais tarde Paulo escreveu sobre isso no capítulo dois de sua carta aos Gálatas. Ele escreveu isto: “Quando, porém, Cefas veio a Antioquia, resisti-lhe francamente, porque era censurável. Pois, antes de chegarem alguns homens da parte de Tiago, ele comia com os pagãos convertidos. Mas, quando aqueles vieram, retraiu-se e separou-se destes, temendo os circuncidados. Os demais judeus convertidos seguiram-lhe a atitude equívoca, de maneira que mesmo Barnabé foi levado por eles a essa dissimulação”.
No Concílio de Jerusalém, encontramos um Pedro mudado, corrigido, conquistado por seu irmão Paulo após um confronto bem-sucedido, de acordo com o ensinamento de Jesus em Mateus 18 (cf. Gl 2.11-21). Talvez a coragem que Pedro demonstrou ao falar em Jerusalém tenha se inspirado na coragem de Paulo ao falar com ele em Antioquia.
Mas, e se Paulo nunca tivesse confrontado Pedro? O que teria acontecido com a fé de Barnabé e dos outros crentes de Antioquia? E se Pedro nunca tivesse sido corrigido e, consequentemente, nunca tivesse falado no Concílio de Jerusalém? O que teria acontecido com a unidade e a missão da igreja naquela época, e que tipo de teologia da igreja teríamos herdado?
E então eu faço essa pergunta aos nossos líderes da igreja hoje. O que acontece quando encobrimos o comportamento errado dos nossos colíderes? Ou quando falhamos em confrontar corajosamente os ensinamentos errados sobre o que é necessário para a salvação? Por exemplo, falsos ensinamentos de que a salvação pode ser conquistada por meio de boas ações, ou por meio do desprezo pelo próprio corpo. O que acontece quando os líderes da igreja ficam em silêncio diante de ensinamentos errados em vez de confrontar os guardiões polarizadores que dividem os crentes?
Não tanto de judeus e gentios, embora isso ainda aconteça hoje, mas mais de jovens e velhos, ricos e pobres, homens e mulheres, educados e analfabetos, deficientes e fisicamente aptos, pessoas nascidas em lares de crentes e crentes forçados a sair de seus lares para crer. Quando ficamos em silêncio em momentos de dizer a verdade, o futuro da igreja está em jogo. Mas também devemos admitir que quebrar o silêncio nos traz um alto custo.
Quando Jesus confrontou a hipocrisia e os falsos ensinamentos dos líderes religiosos de sua época, isso lhe custou a vida, e tem custado a vida de seus seguidores desde então. Às vezes fisicamente, na maioria das vezes psicologicamente.
Acredito que, um dia, toda a comunidade missional terá que pagar um preço não importa o que aconteça. A questão é: Será o custo de ficar em silêncio e deixar que os falsos ensinamentos nos dividam? Ou será o custo de quebrar o silêncio e ensinar os verdadeiros ensinamentos que deveriam nos unir? Pedro quebrou o silêncio e lembrou ao Concílio como Deus evidenciou sua aceitação pelos gentios, dando-lhes o Espírito Santo, assim como tinha dado aos judeus.
Agora, todos nós sabemos que quando lemos nos Evangelhos os ensinamentos de Jesus, sabemos que Jesus fez algumas distinções bem claras, como distinções entre luz e escuridão, santidade e hipocrisia, a porta estreita e a porta larga. E como igreja, faríamos muito bem em traçar as linhas divisórias onde Jesus as havia traçado.
Mas em sua igreja, Jesus não fez distinção entre nós e eles. Judeus e gentios, liberais e conservadores, modernos e tradicionais, complementaristas e igualitários, missionários estrangeiros e líderes indígenas. Ele não fez distinção entre pessoas pertencentes a várias raças ou afiliações políticas, desde que tenham sido batizadas em Cristo e se revestiram de Cristo, pois em Cristo somos todos um. Não divida o que Jesus uniu, não faça distinções onde Jesus não fez nenhuma.
Pedro conclui seu discurso com esta poderosa pergunta profética: “Agora, pois, por que vocês querem tentar a Deus, pondo sobre o pescoço dos discípulos um jugo que nem os nossos pais puderam suportar, nem nós?” (v. 10). Para Pedro, o tipo de distinção que resulta em “nós versus eles” eleva-se a ponto de tentar a Deus.
Em outro lugar no Novo Testamento, Tiago escreveu: “Mas, se tendes no coração um ciúme amargo e gosto pelas contendas, não vos glorieis, nem mintais contra a verdade”. Tiago está alertando contra aqueles que justificam a visão com base em motivos errados e ainda fingem ser defensores da verdade. Ele está dizendo “vocês estão realmente traindo a verdade”. Distorcer as palavras de Deus, de forma a dividir o seu povo e obstruir sua missão, é um ato de traição. E o próprio Pedro responde à sua pergunta: “Cremos que somos salvos pela graça do Senhor Jesus, assim como eles” (v. 11).
Depois dessa afirmação teológica fundamental, Paulo e Barnabé têm a chance de demonstrar essa verdade compartilhando os sinais e maravilhas que Deus tem feito entre os gentios por meio deles. E então somos informados de que toda a assembleia fica em silêncio. Mas veja, esse é um tipo diferente de silêncio. Este não um silêncio de espectador, sobre o qual falamos antes, um silêncio descomprometido, que encobre os erros dos outros ou de si mesmos. Nem um silêncio temeroso, que não é “confrontacional”. Nem ainda um silêncio oprimido, que se rende à injustiça. Não. Este é um silêncio convicto, rendido à voz do Espírito Santo. Um silêncio que reorienta uma comunidade missional para declarar e mostrar livremente a verdade de Cristo.
“Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós”
Tendo ouvido as discussões teológicas que estavam acontecendo no conselho e os relatos que vieram dos campos missionários por meio de Paulo, Barnabé e Pedro, Tiago enquadra toda a discussão dentro do testemunho das Escrituras. Ele primeiro recita uma profecia do profeta Amós a fim de ajudar o Concílio a interpretar suas experiências atuais corretamente, assim como essas experiências testificam o cumprimento da profecia: “Depois disso, voltarei e reedificarei o tabernáculo caído de Davi; reedificarei as suas ruínas e o restaurarei. Para que o restante da humanidade busque o Senhor, juntamente com todos os gentios sobre os quais tem sido invocado o meu nome, diz o Senhor” (v. 16-18). Em seguida, compartilha sua opinião como um entre iguais e diz: “Por isso, julgo que não devemos perturbar aqueles que, entre os gentios, se convertem a Deus” (v. 19). E sugere que escrevam uma carta explicando que pareceu bem ao Espírito Santo e a eles não sobrecarregá-los com nada.
Nós amamos a frase “pareceu bem ao Espírito Santo e a nós” (v. 28), não é mesmo? É uma das dez citações favoritas da igreja primitiva. Mas será que entendemos o processo pelo qual a igreja primitiva chegou a tal declaração? Foi um processo de falar uns com os outros – não uns para os outros ou uns sobre os outros. Foi um processo que levou horas de disputas e debates em Antioquia, seguido por longas horas de discussão em Jerusalém entre pessoas que tinham visões opostas sobre o mesmo assunto.
Imagine quanto tempo, esforço e dinheiro teriam sido economizados se os falsos mestres em Antioquia tivessem apenas escutado e se retratado. Imagine se Paulo e Barnabé não tivessem precisado interromper seu ministério, deixá-lo para trás e sofrer uma longa jornada de Antioquia a Jerusalém, e de volta a Antioquia para resolver essa questão mais básica sobre a salvação.
Mas honestamente, sou grata que as coisas aconteceram do jeito que aconteceram porque isso nos mostra que a igreja primitiva era real, não muito diferente da igreja hoje. Por tudo o que o Espírito Santo fez nos apóstolos e por meio deles naquela época. A igreja ainda precisava decifrar questões teológicas em uma reunião com pessoas que tinham visões opostas sobre o mesmo assunto. Esse incidente mostra o preço e o processo pelo qual chegamos a uma declaração do tipo: “Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós”. Uma declaração nascida da oração diária, do compromisso com o ensino da Palavra, do partilhar do pão e de uma generosidade notável. Uma declaração que preserva a voz da igreja e é reservada para a voz da igreja, de toda a igreja junta, incluindo pessoas que têm visões opostas. Não é uma declaração de um único líder que, depois de um retiro pessoal, voltar com decisões para a igreja e dizer: “Pareceu bem ao Espírito Santo e a mim”. Esse líder da igreja não somos nós. A igreja junta somos nós. Também não é uma declaração de um determinado grupo de líderes, motivado por finanças, poder ou status com base em finanças, que justificam marginalizar outros crentes sob o pretexto de “pareceu bem ao Espírito Santo e a nós”. Este grupo de líderes da igreja também não somos nós. A igreja unida somos nós. É hora de restaurarmos a arte perdida das discussões da igreja. A arte de falar e ouvir uns aos outros. Mesmo para aqueles que se opõem às nossas visões sobre como interpretar a Bíblia, ou como adorar, ou quem deve liderar na igreja, ou qual país abençoar e qual nação amaldiçoar. É hora de aprendermos com a igreja primitiva a disciplina de criar espaços seguros – para nos dar uma chance, para reconsiderar nossas posições presumidas à luz do que está em jogo, ou seja, a unidade e a missão da comunidade de Deus.
Você já ouviu isso antes, na unidade essencial, na liberdade não essencial, em todas as coisas, caridade e amor. Paulo fala em sua carta aos filipensessobre esse tipo de caridade, esse tipo de amor como o oxigênio que a igreja precisa para respirar. Quando ele orou para que o amor deles abundasse mais e mais em conhecimento e em profundidade de percepção para que pudessem discernir o que é melhor.
Paulo está dizendo: “Pratiquem o discernimento juntos. Não se concentrem em coisas menores ou vocês falharão nas principais prioridades da sua missão”. Parte do discernimento é reconhecer a urgência do nosso chamado. A igreja primitiva realmente acreditava que Jesus voltaria em breve, que a colheita era abundante, que os trabalhadores eram poucos e que a Grande Comissão não poderia ser cumprida com apenas uma parte dela. Todos eram necessários. Precisou aprender rapidamente como se tornar uma equipe forte, lutando juntos em vez de uns contra os outros.
De volta ao filme Remando para o ouro, a conversa entre os treinadores continou enquanto eles perguntavam como fazer esses oito atletas atingirem seu máximo potencial como uma equipe unificada? Talvez, o problema não estivesse nos atletas, mas em ter o timoneiro certo. O timoneiro é a nona pessoa no barco, essencial para o sucesso da equipe. Enquanto os oito atletas remam voltados para trás, o timoneiro é posicionado para a frente, sendo a única pessoa qualificada para definir a direção e o ritmo do barco. Ele é o único capaz de deixar os atletas saberem onde estão na corrida e o que é necessário para vencê-la. E então os treinadores colocaram um novo timoneiro neste barco, que passou longas horas treinando cada vez mais esses oito atletas para remar, não como se estivessem em uma única corrida, mas para remar como uma equipe.
O Espírito Santo é o timoneiro do barco, que é a igreja. Por ser onipotente, é o único qualificado para definir a direção e o ritmo de como melhor terminar a corrida, ao trazer clareza e unidade aos egos humilhados que estão dispostos a serem transformados e reformados continuamente por Deus.
Concessões de cá e de lá
A carta de Jerusalém declara quatro requisitos: abstenção de alimentos sacrificados a ídolos, de sangue, da carne de animais estrangulados e da imoralidade sexual (v. 29). Por quê? O Concílio não havia concordado em não sobrecarregá-los? Os gentios não estavam agora livres em Cristo? Sim, a liberdade deles havia sido conquistada por Cristo. Mas precisava ser uma liberdade responsável, atenciosa para com os crentes mais fracos. Tiago viu na ausência desses requisitos uma ameaça à unidade e ao testemunho da igreja. Ele viu uma ameaça à unidade da igreja. Acho que foi sensato que, assim como o Concílio esperava que os crentes judeus fizessem uma concessão sobre a exigência da circuncisão, esperava também que os crentes gentios fizessem concessões sobre essas quatro exigências, a fim de manter a unidade por meio do vínculo da paz.
Os crentes judeus têm ouvido sobre essas exigências em todas as cidades desde os primeiros tempos e já alinharam suas vidas diárias de acordo com essas exigências. Portanto, eles podem achar essas quatro práticas terríveis se praticadas por seus companheiros crentes gentios e talvez sejam desviados pela ofensa contínua.
O Concílio em Jerusalém sabia que o Espírito Santo fez a igreja uma, mas reconhecia que essa unidade estava em construção. Para alcançar a unidade, todos os membros deveriam considerar não apenas seus próprios interesses, mas também os interesses dos outros.
Tiago estava preocupado também com o testemunho da igreja perante seus vizinhos não crentes. O cerne da missão, conforme declarado na profecia de Amós, era que o restante do povo pudesse buscar o Senhor. Portanto, a igreja em Antioquia precisava remover quaisquer pedras que estivessem no caminho dos não crentes em direção à fé e à salvação. Afinal, o que os separaria como seguidores de Cristo se continuassem a comer carne sacrificada a ídolos e se envolvessem em imoralidade sexual?
O ser da Igreja é em si uma missão. Isso então levanta a questão: que exigências devemos colocar sobre nós mesmos em nossa liberdade em Cristo para remover todos os obstáculos do caminho de nossos vizinhos não crentes? Do que devemos nos abster em pensamentos, palavras, ações e relacionamentos para manter a comunhão com nossos irmãos e irmãs crentes, sem comprometer a verdade do evangelho? Em um congresso como o Lausanne 4, podemos chegar a respostas que se aplicam à igreja global, mas também é importante chegar a respostas que sejam contextualizadas aos nossos cenários culturais e missionários únicos.
Correção, alegria, consolo e paz
John Stott disse uma vez: “O maior obstáculo ao avanço do evangelho em todo o mundo é a falha do povo de Deus em viver como povo de Deus”. Continuando em Atos 15, lemos que, quando a igreja de Antioquia se reuniu e leu a carta enviada pela igreja de Jerusalém, todos ficaram contentes e consolados (v. 31). Aquele poderia ter sido um momento tenso, todos esperando o que as vozes de Jerusalém diriam e qual lado eles defenderiam. Mas o Espírito Santo trouxe alegria e consolo quando a paz da igreja foi restaurada e a ameaça à unidade foi removida.
O Espírito Santo continua a nos oferecer a mesma alegria e consolação hoje. Quando a verdade substitui nosso silêncio temeroso, a unidade é restaurada e somos liberados para retomar pacificamente nossa missão como igreja. É então que podemos declarar e mostrar o cumprimento da oração de Jesus: “A fim de que todos sejam um. E como tu, ó Pai, estás em mim e eu em ti, também eles estejam em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste” (Jo 17.21).
Hoje, é preciso ouvir de novo essas boas novas. A Trindade está investida em nossa unidade como uma comunidade missional. O Pai, o Filho e o Espírito Santo guiam a igreja e definem sua direção e seu ritmo rumo à verdade e unidade, que então produzem o fruto da paz e da justiça. Somos testemunhas da missão pacífica e justa da Trindade em tempos de crise na e por meio da igreja na África do Sul, em Ruanda, no Egito. E hoje oramos para que em breve testemunhemos a missão pacífica e justa da Trindade na e por meio da igreja nas crises em curso na Ucrânia, no Sudão e em Gaza.
Afinal, os oito atletas de Remando para o ouro aprendem a trabalhar juntos. Vencem, apesar de tudo, e se classificam para competir nas Olimpíadas de 1936 em Berlim. Pouco antes da competição, seu treinador dá a eles um último discurso motivacional: “Remem pelo seu país. Remem uns pelos outros. Remem por aquele momento em que tudo o que está contra vocês pode ficar em segundo plano”. E foi isso que eles fizeram. Eles remaram desimpedidos a ponto de enfrentarem os maiores rivais e conquistam o ouro olímpico.
E assim fez também a igreja primitiva. Eles descobriram maneiras de ouvir uns aos outros, de se unirem, apesar de suas diferenças, e seguiram adiante em sua missão desimpedidos – que é a última palavra no livro de Atos na versão grega.. Os seguidores de Cristo e seu evangelho continuaram a superar todos os obstáculos e todas as divisões. E sabemos que um dia, pela graça de Deus, as palavras de 1 João 4.4 finalmente serão verdadeiras: “Filhinhos, vocês são de Deus e venceram os falsos profetas, porque aquele que está em vocês é maior do que aquele que está no mundo”. Por causa dessa verdade, descansamos e nos alegramos. A Igreja de Cristo sempre será invicta.
Na última cena do filme, há uma conversa que acontece anos depois, entre um dos oito atletas e seu netinho: “Vovô, você gostou de remar em uma equipe de oito homens?”, ao que o avô responde: “Oito? Nunca fomos oito. Éramos um”.
Irmãos e irmãs em Cristo, Jesus orou: “Eu quero que eles sejam um”. Irmãos e irmãs em Cristo, nós somos um.
Você poderia orar comigo?
“Santo Jesus, nós te agradecemos por nos fazer um. Perdoa-nos pelas vezes em que quebramos essa unidade. Dá-nos o poder, a graça e a humildade para reconstruir a unidade para a qual nos criaste. Vem agora, Senhor Jesus, faz de nós um. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém”.
- Anne Zaki é professora de teologia prática e pregação no Seminário Teológico Evangélico do Cairo, no Egito. Este artigo é fruto da exposição bíblica feita por ela no Quarto Congresso Lausanne. Transcrição feita com permissão da autora a partir do vídeo disponível aqui.
Transcrito e traduzido por Ana Laura Morais.

“Que a Igreja anuncie e demostre Cristo, unida” é o tema do 4º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial realizado em setembro de 2024 na Coreia do Sul, e registrado por Ultimato numa ampla matéria de capa.
Colaboraram com esta edição líderes, missionários, pastores que participaram do evento e que prosseguem trabalhando em favor do cumprimento da Grande Comissão.
É disso que trata a matéria de capa da edição 411 da revista Ultimato. Para assinar, clique aqui.
Saiba mais:
» A Igreja – Uma comunidade singular de pessoas, John Stott e Tim Chester
» Unidade da Igreja e Cooperação na Missão, Leandro Silva (org.)
» Para que todos sejam um – A unidade da igreja é possível?, edição 397 de Ultimato
» A Declaraçaõ de Seul - 4º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial
» Olhando para frente, por Sabrina Barroso Silva Lujić e Justin A. Schell, 4º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial
» Descobrindo o potencial da diáspora: um chamado à igreja brasileira, por Fabiana Braun, 4º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial
22 de janeiro de 2025
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