Entre o Espírito e a Letra

Tweetar

Há tempos venho sentindo algo estranho na carne. Quando vejo o que escrevemos, pensamos e sentimos penso no quão curioso é nossa formação de influência cristã e sua interferência nos escritos e em qualquer bate-papo de bar. É como se fosse uma linguagem em comum que dá vazão a uma variedade de impressões e idéias a respeito da vida.

Será que a coisa é nosso objeto de diálogo ou só uma expressão de uma "coisa de fato, em si"? Será Cristo o Verbo ou uma projeção imaginária em comum de nossos clamores? Será a Graça existente ou uma palavra comum de diálogo que representa o nada e as fatalidades humanas?

São perguntas complicadas. Confesso que comecei a pensar e escrever hoje sem objetivo de dar uma arquitetura racional de argumentos e pretensões de respostas. Minha sensação é de uma expectativa a respeito de algo que virá de maneira completamente independente de minha vontade ou torcida.

Por falar em vontade e torcida há dois tipos de ortodoxos: um acredita profundamente e leva sua profissão de fé a sério, mesmo esta não indo a favor do seu ego (esse é o cara legal que entende a Cruz); o outro acredita em todo um sistema de doutrinas e visões de mundo, às vezes até interessantes, a fim de satisfazer seu desejo de poder ou vaidade (esse é o cara chato). Falando assim até parece que o mais importante não é "no que" se acredita, mas "pra quê" ou "a favor do que”, mas isso é outro longo e complicado assunto...

Pois bem, voltando à questão. Palavra ou Expressão? Coisa ou Projeção? Visão ou Miragem?

Eis que o Espírito me impele a falar, mas falar é encarnar. Quando a palavra "Graça" aparece na minha boca para expressar a vida, eis que a Graça encarna na vida no mesmo instante que falo. Quando sinto uma coisa e digo "amor", eis que o amor acabou de acontecer. Quando olho uma folha voando e digo "tristeza", é porque a tristeza estava junto da folha.

Palavra é expressão e encarnação. Eis que o Verbo se fez carne e habitou entre nós. Eis que a imaginação encontrou a mulher, e virou Graça. Eis que a bola encontrou o menino e o sonho virou gol. Eis que a música encontrou os ouvidos e a tristeza aconteceu. Eis que o Verbo se fez carne e habitou entre nós.

Essa é a resposta que me foi dada: Não, não é só expressão ou linguagem comum. Também não, não é fundamento das expressões, idéias ou linguagem. É outra coisa, essa coisa que sentimos. É a Palavra encarnando, habitando entre nós, e se tornando Graciosa, real e imaginária, triste e sorridente, ilusão e realidade, luz e escuridão.

Assim, toda vez que um poeta declamar sua alma, um artista dedilhar o violão ou um homem declarar-se a uma mulher, Cristo estará ali, encarnando, Verbo que se faz coisa e coisa que se faz Verbo.

O Espírito não sabe escrever, não sai de seus punhos a Letra. O que acontece é que eles nascem juntos, engajados, são uma coisa só. Pronunciar é o mesmo que ser arrebatado, impelido. Talvez seja parecido com o que aconteceu na Criação, onde à medida que Deus falava tudo aparecia.

A fala e o fundamento enfim são um, não há distinção. Eu não posso fazer nada em relação a isso, já avisei que não arquitetei argumento algum. Simplesmente aparece, acontece. Minha fé, vejam só, é involuntária. Não acredito porque gosto, mas sim porque isso me vem, acontece. Isso se chama Graça.

Bendito seja Deus por sua criação e infinita misericórdia. Que o Espírito Santo continue como um vento colocando palavras Graciosas nas bocas, sensações e pensamentos. Que Cristo, nosso Senhor, seja entronizado aqui e em todos os cantos e corações da Terra, porque Ele é o alfa e o ômega, para todo o sempre, autor da salvação e consumador de toda fé.


www.osdecadentes.blogspot.com

Tweetar

Opinião do leitor