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Palavra do leitor

Confissões, Fernando Pessoa e Jesus de Nazaré

Há um ensino muito enfático, inclusive entre cristãos, de que nós somos fortes, poderosos, os merecedores de toda a felicidade, que teremos todos os sonhos realizados e jamais fracassaremos. Nada mais contrário à bíblia e a realidade.
Há um poema de Fernando Pessoa (sob o nome de Álvaro de Campos) que tem falado muito comigo nos últimos dias e mostra essa realidade. Ele se chama "Poema em linha reta" e no começo diz:

"Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita..."

Estamos em um tempo em que ninguém mais confessa o pior de si para os outros. Vivemos em dias em que as pessoas, e nós também, ansiamos mostrar nossa força, superioridade e que vamos bem, e não apenas bem, mas melhor que eles.
O poeta traduz bem isso dizendo que todos a quem ele conhece se declaram campeões em tudo, jamais perdem, sempre triunfam, mas ele "tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil"..

O poeta vem a confessar na poesia, não apenas atos maus, mas atos vergonhosos. De atos maus alguém pode se orgulhar e se exaltar, mas de atos vergonhosos apenas sentir vexame:

"Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;"

Ele declara ter sido fraco e covarde muitas vezes, mas quem é que não tem? Ele declara o que todos nós somos lá no íntimo, mas ninguém ousa ser o primeiro a confessar. E neste mundo de vilões e covardes inconfessos "Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma covardia!
Não, são todos o Ideal, se os ouço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?"

E a pergunta continua sem resposta. Quem neste século 21, neste mundo em que seu lado político e econômico é o melhor e o do outro é opressor, sua teologia, sua igreja é a verdadeira e as outras desprezíveis, quem será o primeiro a confessar uma covardia, um ato vil, uma incoerência, um sentimento?
Pois estamos todos fartos, como o poeta "estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil..."

Estamos fartos dos vencedores e dos heróis, que a tudo conquistam e jamais choram, jamais fraquejam. Num mundo assim como dizia certo filme é um lugar "Onde os fracos não tem vez", os ridículos não podem mostrar quem são, não podem contar o que sentem.

Onde é que há gente no mundo? é a nossa pergunta, gente de carne e osso, que falha, se atrasa, se esquece, se perde, que escolhe mal, que volta atrás, que sente o que não devia sentir, que devia ser grato mas não é.

Foi um grande teólogo católico do século 20, Chesterton, quem disse que a igreja deve ser a responsável por impedir que um pecado se torne um segredo. É na confissão, diz ele, que somos impedidos de que um pecado corroa a alma. Quando falo em pecado, falo não apenas de um ato mal como o de trapacear e mentir, pois desses é fácil se orgulhar, mas falo também das culpas, das vergonhas, das omissões. Uma das primeiras reações de Adão ao experimentar o pecado foi ter vergonha e se esconder. E hoje ainda repetimos isso.

Falo também não apenas do pecado cometido, mas do pecado sofrido, o pecado que não causamos, mas causaram em nós. O abuso, a violência, o maltrato, o engano, um juízo implacável e falta de misericórdia conosco. Todo pecado que sofremos e que não é confessado se torna mágoa e portanto pecado cometido, pois como dizia o salmista "Enquanto escondi os meus pecados, o meu corpo definhava de tanto gemer."(Sl 32:2) e ainda um filósofo grego "se um homem mal lhe faz injustiça, perdoe-o para que não haja dois homens maus"

Precisamos de pessoas que confessam seus pecados, mas também suas fraquezas, seus medos. O maior homem do mundo, o mais corajoso e perfeito, Jesus de Nazaré, também se confessou, não a Deus, mas a amigos, e não o pecado, mas a fraqueza, pois

"Levou consigo Pedro, Tiago e João, e começou a ficar aflito e angustiado.
E lhes disse: "A minha alma está profundamente triste, numa tristeza mortal. Fiquem aqui e vigiem". Marcos 14:33,34

Como disse Lewis em "Os quatro amores" o nosso modelo é Jesus, não apenas "o do calvário, mas da carpintaria, nas estradas, nas exigências clamorosas" e eu acrescentaria também, o Jesus das confissões, que mostrou fraqueza e humanidade e angústia, e na realidade, a maior de todas as angústias pois sabia que estava prestes a ser separado do Pai para pagar pelo pecado da humanidade. Se este modelo não é suficiente para nos impulsionar a um lugar de confissão, eu não sei qual será.
Seropédica - RJ
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