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Opinião

Odiados pela sociedade, amados por Deus

Contribuição pastoral e cidadã de evangélicos a pessoas encarceradas

Por Clemir Fernandes

Os evangélicos no Brasil

É ampla e diversa a contribuição evangélica para a sociedade brasileira, como nas áreas de educação e saúde, reconhecida por escritores e outras personalidades, não somente pertencentes ao grupo religioso, desde muito tempo. A despeito de todos os preconceitos e violências sofridos por evangélicos desde o período histórico da colonização, quando era religião tolerada, até adentrar no século 20 após o advento da República, os evangélicos gozavam de respeitabilidade ética pelas pessoas em geral. No entanto, muita coisa mudou desde os anos 1970, com a ditadura civil-militar, quando parte dos evangélicos permaneceu indiferente ou deu apoio formal ao regime autoritário, embora uma minoria tenha participado de sua resistência. No processo da redemocratização – com o apoio de evangélicos no Congresso Nacional ao governo de José Sarney em troca de benefícios diversos, como concessão de canais de rádio e TV –, a identidade evangélica seguiu, de certa forma, um curso de deterioração ética, culminando com a adesão radical de amplos setores evangélicos ao governo dos anos recentes.

A presença evangélica no Brasil é diversa e multifacetada, como é a própria sociedade brasileira, e, apesar de todos os problemas dos últimos anos, ela segue com uma contribuição relevante ao país. E isso se deve muito mais pela ação de pessoas da base das igrejas do que necessariamente de suas cúpulas e lideranças midiáticas. Um exemplo destacado disso é a presença evangélica no trabalho de assistência religiosa no sistema prisional do país. 

Impunidade e punitivismo

Existe uma percepção bem comum da população de que o Brasil é o país da impunidade. Resta saber de que grupo se está falando, já que a terrível cultura do punitivismo tem crescido no país. Um dado eloquente diz respeito ao próprio número de pessoas encarceradas. Em 1988, ano de promulgação da chamada Constituição Cidadã, havia aproximadamente 90 mil pessoas nas prisões brasileiras. Trinta e cinco anos depois, temos atualmente o estratosférico número de cerca de 900 mil encarcerados, fazendo do Brasil o terceiro no ranking mundial entre os que mais aprisionam em números absolutos, atrás apenas da China e dos Estados Unidos. O fato de haver mais pessoas presas, no entanto, não significou melhoria da segurança pública no país. 

Como é sabido, a impunidade no Brasil tem a ver principalmente com raça, situação econômica e nível educacional. Brancos, ricos e aqueles com maior escolaridade estão entre os que conseguem escapar do sistema prisional, mesmo tendo sido alcançados pelo sistema de justiça. Já pretos, pobres e aqueles com pouca escolaridade são os que mais lotam as prisões brasileiras. Em rigor, superlotam, pois há grande déficit de vagas. Os espaços são insalubres, com problemas que incluem falta de água, luz do sol, medicamentos, material de higiene, entre outras coisas, numa violação da Constituição Federal, que diz textualmente no art. 5º, XLIX: “É assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”. No entanto, a lei nem sempre é cumprida, violando preceitos constitucionais de dignidade da pessoa humana e outros direitos fundamentais de presos.



Assistência religiosa como direito constitucional
A Constituição Federal assegura às pessoas presas o direito à assistência religiosa e, portanto, o direito de exercer sua liberdade de crença. Para garantir tal direito, o Estado brasileiro não oferece serviço público de assistência religiosa, mas depende da ação voluntária de pessoas e entidades religiosas para atendimento desse direito demandado por pessoas privadas de liberdade. São vários os grupos religiosos com esse tipo de atuação no sistema prisional, que tem regras próprias em cada estado da federação. Estes controlam a maioria dos equipamentos públicos de encarceramento, exceto as unidades que são de gestão federal. 

A presença católica nos espaços prisionais, em serviços conhecidos como capelania, é histórica no Brasil, inclusive com templos próprios e exclusivos. Há muitas décadas, os evangélicos foram adentrando os espaços de assistência religiosa e atualmente respondem pela ampla maioria dos atendimentos nas prisões brasileiras. Dados de pesquisa do Instituto de Estudos da Religião (ISER) de 2015 mostram a força das igrejas evangélicas no sistema prisional do estado do Rio de Janeiro, por exemplo, com a maior oferta de serviços de capelania. A maior parte desse trabalho é feita por pessoas simples das igrejas, que viajam longas distâncias até os espaços prisionais, geralmente em transportes públicos, e enfrentam desafios rotineiros para conseguir prestar seu trabalho pastoral de cuidado para com pessoas esquecidas e estigmatizadas pela sociedade.

Além dos estudos, pregações, orações, cânticos e até batismos, os evangélicos contribuem para melhorar minimamente a situação dessas pessoas doando itens diversos de higiene pessoal. Sabonete, creme dental, xampu, absorventes íntimos, roupas e toalhas são alguns dos produtos doados pelas igrejas e levados aos presídios. Em rigor, é proibido fazer essas doações, pois os produtos devem ser providos pelo Estado; entretanto, isso nem sempre acontece, por razões que sabemos. Se faltam recursos para escolas e hospitais, imagine para prisões!

O Brasil é um país que trata muito mal seus presos. Alguns religiosos estão entre a destacada exceção, pois cuidam de pessoas encarceradas com dignidade, generosidade e amor, além de respeito pela diversidade religiosa, como bem exemplificam vários grupos evangélicos em suas ações de acolhimento, conforto, humanização, enfim, reconhecimento de direitos. Seus voluntários são como anônimos de Deus, pois servem a pessoas com as quais o próprio Jesus se identificou: “Estive preso, e vocês me visitaram” (Mt 25.36). Agindo assim, eles são, efetivamente, defensores de direitos humanos de uma população muitas vezes invisibilizada e até odiada por muita gente, mas profundamente amada por Deus. Reconhecer que essas pessoas precisam ter seus direitos garantidos, inclusive para o sentido idealizado da prisão, embora dificilmente alcançado, é condição para restaurar esses filhos e filhas de Deus à convivência digna e segura em sociedade.
 
  • Clemir Fernandes, pastor e sociólogo, é diretor-adjunto do Instituto de Estudos da Religião, coordenador de teologia do Djanira Instituto de Pesquisa e Ensino e membro do colegiado pastoral da Igreja Cristã da Tijuca, no Rio de Janeiro, RJ.

Artigo publicado originalmente na edição 403 de Ultimato.

Imagem: Unsplash

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Saiba mais:
» Como Anunciar o Evangelho entre os Presos – Teologia e prática da capelania prisional, Antonio Carlos Junior, Cristiano Rezende Franco, Elben César
» Casas de Chá – As Mulheres do Distrito da Luz Vermelha, Shine LEE
» Lembrem-se dos que estão na prisão, por Elben César
» O que os cristãos têm a ver com as prisões?, por Antonio Carlos da Rosa Silva Júnior

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