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Por Escrito

Entre negociações, críticas e desesperança: o que eu vi na COP30

Impressões de nove dias entre a Zona Azul, a cidade de Belém, os bastidores das negociações climáticas e a contribuição dos grupos de fé

Por Phelipe Reis

Hoje é sábado, manhã de 15 de novembro. É meu último dia presencialmente aqui na COP30, em Belém, PA. Escrevo este relato na sala de computadores da Zona Azul, onde dezenas de notebooks ficam disponíveis, com internet liberada para qualquer um usar.

Enquanto milhares caminham lá fora, pelas ruas de Belém, na Marcha Global pelo Clima, sob um sol escaldante, eu tento organizar meus pensamentos, ideias, dúvidas e perguntas. A marcha é muito representativa. Aliás, uma marca desta edição da COP tem sido justamente a participação popular, algo limitado nos dois últimos anos por restrições dos países anfitriões.

Na entrada da Zona Azul, a segurança está reforçada – provavelmente preparada para intervir caso alguns manifestantes tentem entrar na área das negociações.

É a minha primeira vez em um evento como este. O mais parecido que experimentei foi o Quarto Congresso Lausanne de Evangelização Mundial, em 2024, em Seul. Mas a COP é dez vezes maior.

Estou com um grupo de quase quarenta pessoas, hospedados em uma igreja local, num bairro não tão distante do Parque da Cidade, onde o evento acontece. O grupo é diverso: gente de diferentes igrejas evangélicas, de cidades como Campinas, Tefé, Maceió, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e de países como Panamá, Colômbia, Peru e Bolívia. É um grupo muito rico – pessoas com experiência socioambiental ao lado de jovens sonhadores, alguns concluindo a primeira graduação, outros cursando a segunda, todos desejosos de fazer diferença no mundo a partir da fé em Jesus Cristo.

No meio deles, fico atento, ouvindo histórias, conhecendo experiências e trabalhos. Ao mesmo tempo, tento relacionar tudo isso com as discussões e os temas que viemos acompanhar neste evento gigantesco. Não é fácil.

Desde o início da COP tenho frequentado a Zona Azul, mas nosso grupo também participa de várias atividades que acontecem em outros espaços importantes para a sociedade civil: mesas e painéis na Zona Verde, no Tapiri Ecumênico e na Cúpula dos Povos. Estivemos na Barqueata, no barco da Sociedade Bíblica do Brasil (SBB), e participamos da Vigília pela Terra, organizada pelo ISER. Isso sem contar as inúmeras atividades culturais espalhadas pela cidade das mangueiras. É muita coisa – impossível acompanhar tudo.

Nos corredores da Zona Azul há pavilhões de países e organizações. Ali acontecem discussões e palestras em que governos mostram o que estão fazendo para enfrentar a crise climática. Sempre há brindes, lanches e cafés gratuitos – e filas enormes. Acabo não pegando nada, porque passo o tempo todo correndo para fazer fotos, vídeos, editar materiais e publicar.

Alguns integrantes do nosso grupo participaram de mesas e painéis nos pavilhões oficiais. Na terça-feira, um painel organizado pelo ISER, no pavilhão oficial do governo brasileiro, discutiu a contribuição dos grupos de fé para a justiça climática e para a implementação das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs). Ouvimos a ministra Marina Silva, a irmã Jocabed Solano, indígena Guna-Dule do Panamá, além de representantes de outras tradições religiosas.

Há também uma área reservada aos grandes veículos de comunicação – Globo, CNN, Band. Todos os dias esbarramos com profissionais como Fernando Gabeira e André Trigueiro, referência no jornalismo ambiental. Entrevistei o Trigueiro, que espero publicar em breve. Outro dia encontrei a jornalista Sônia Bridi no almoço (de quarenta reais).

Além dos quiosques de lanche, há uma grande área com dezenas de salas onde acontecem as negociações.

Aprendi mais sobre esse processo conversando com uma jovem cristã que trabalha na ONU, e que conheci aqui. Curioso, fiz várias perguntas. Ela explicou que as negociações acontecem o dia inteiro, todos os dias. Algumas reuniões são fechadas – só negociadores entram. Outras são abertas a observadores. Há diplomatas experientes, como os brasileiros, mas também negociadores muito jovens, como uma moça de 22 anos representando o Sudão.

O processo é técnico, cansativo e demorado. Os países discutem textos que já chegam parcialmente preparados, com pontos consensuais e pontos que precisam ser acordados. Os documentos são públicos, disponíveis no site da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC). Tudo que está entre colchetes indica divergência. Os negociadores leem, discutem item por item e buscam consenso. Não há votação individual; os países se organizam em blocos, e os blocos buscam acordos para os textos finais.

Mas essas negociações estão avançando? Os especialistas divergem.

Cláudio Ângelo, do Observatório do Clima, disse que as consultas da Presidência da COP estão sendo chamadas de “terapia coletiva”.1

Antônio Andrioli, da Universidade Federal da Fronteira Sul, alerta: “Nunca confie numa COP”. Para ele, não há expectativa concreta de eliminação definitiva das energias fósseis.2

Ailton Krenak afirma que a COP tem vocação de balcão de negócios – e que a verdadeira conferência acontece no murmúrio das águas, no canto dos peixes sobreviventes, nas palavras de quem lembra que a Terra respira.3

Já Renato Zimmermann disse que a primeira semana trouxe avanços rumo à transição justa e à industrialização verde.4

E Carlos Henrique, da IRI Brasil, avaliou que esta COP tem sido histórica5, com ampliação de fundos e destaque para o TFFF.6

Entre pessimistas e otimistas, há uma árvore.

Uma árvore no meio do caminho – no corredor que leva ao restaurante da Sociobio, o mais barato. Entre o cinza dos tapetes que cobrem a Zona Azul, ela se destaca: esguia, tronco fino, poucos galhos, poucas folhas. Parece deslocada. Ou talvez sejamos nós os deslocados, porque ela estava ali antes da construção do Parque da Cidade.

Essa árvore me chamou a atenção. Filmei, fotografei. Sempre que passo por ela, não deixo de notar. Observá-la me traz esperança. É sinal de vida. Lembra-me que não somos meros intérpretes num grande teatro global.

Eu não posso pensar de outra forma. Eu, meus irmãos e irmãs que estão aqui, estamos imbuídos de fé – a certeza daquilo que não vemos. Fé no Deus Criador, dono de todas as coisas, que nos deu a tarefa de cultivar e guardar, que se revela por meio da criação e que, em Cristo, está reconciliando todas as coisas no céu, na terra e debaixo da terra. Essa fé não nos permite agir de outro modo senão buscando cuidar da criação e do próximo.

A COP entra na sua segunda semana, mas eu deixo Belém após nove dias. Provei seus sabores, senti seus cheiros e seu calor. Vi sua gente esperar ônibus, conversei com um motorista de aplicativo que não concorda com a COP, ouvi uma mulher ribeirinha que mora do outro lado do rio e que nem sabe o que significa a COP. Conversei com um pastor que recolhe material reciclável toda noite no final do evento. Andei nos corredores dos diplomatas e andei na periferia de Icoaraci onde o esgoto corre a céu aberto.

Foram muitas experiências – algumas contraditórias. Eu poderia voltar para casa desiludido, mas volto para as minhas crianças querendo dizer a elas: “Eu, e muitos outros seguidores de Jesus, estamos trabalhando para deixar um futuro e um planeta melhor para vocês, porque isso é sinal de novo céu e nova terra. E tem muito trabalho pela frente. Vamos começar pelo nosso quintal, plantando as sementes que ganhei de um projeto de coletoras do alto Rio Xingu?”.

  • Phelipe Reis é jornalista, missionário e colaborador do movimento Renovar Nosso Mundo. Coordena a cobertura colaborativa dos evangélicos na COP30.

Notas:
1. https://www.instagram.com/reel/DRD4jYPD2oL/?utm_source=ig_web_copy_link&igsh=MzRlODBiNWFlZA==
2
Nunca confie em uma COP. Centro Brasileiro de Estudos de Saúde 
3
Ailton Krenak: "Vocação da COP30 é ser balcão de negócios". Terra.
4
O quinto dia da COP30 foi marcado por avanços concretos rumo à transição justa e à industrialização verde, mas também por impasses que revelam os desafios da diplomacia climática. O Sul.
5.
Plantão COP 30Cristãos na Ciência. 
6. TFFF é a sigla em inglês para Tropical Forest Forever Facility, ou Fundo Florestas Tropicais para Sempre, um modelo de financiamento climático lançado na COP30.



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Saiba mais:
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» Ultimato na COP 30, Notícia
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