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Opinião

Eu [quase] me arrependi de ter tido filhos

A realização pela qual tanto ansiamos requer primeiro o autoabandono.

Por Erica Neves

 “Digo-lhes verdadeiramente que, se o grão de trigo não cair na terra e não morrer, continuará ele só. Mas se morrer, dará muito fruto.” João 12:24

Na sexta-feira, 28 de março, meu filho Pedro completou 10 anos. Por isso, passei essas últimas semanas refletindo sobre a primeira década de vida do meu filho e sobre as mudanças que a maternidade trouxe na minha vida.

Enquanto refletia à respeito, por acaso, me deparei com um texto no The Telegraph que verbaliza com crueza o que eu sentia nos primeiros anos como mãe:
 
“Eu me arrependo de ter tido filhos.”

O texto é um desabafo de uma mulher britânica, escrito em resposta a uma fala da cantora Chappell Roan, que afirmou nunca ter visto pais com filhos pequenos que parecessem felizes. Isso ecoou fundo na autora:
 
“Finalmente, alguém disse isso em voz alta. Trocamos nossa liberdade e nossa identidade pela parentalidade.”

Hoje, já não me identifico com essa dor — mas estaria mentindo se dissesse que nunca estive nesse lugar.

Em outro ponto, ela escreve:
 
“Sentia tanta falta da minha antiga vida que doía.”

E eu entendo exatamente o que isso quer dizer.
 
Quando releio os textos que escrevi nos primeiros anos do Pedro, há muita ressonância com a confissão dessa autora anônima. Eu nunca cheguei a dizer “me arrependo de ter sido mãe”, porque isso implicaria, ainda que indiretamente, na não existência das duas pessoas mais adoráveis do mundo. Mas a saudade e a nostalgia pela vida que não mais existia também doíam — e muito.
 
Num desses textos, escrito quando Pedro tinha apenas duas semanas, eu disse:
 
“Apesar de toda a rede de apoio ao meu redor, nunca me senti tão só. O puerpério é um mergulho profundo — hormonal, neurológico, emocional e espiritual. Gosto de compará-lo à experiência do deserto na vida cristã: um tempo em que Deus trabalha no nosso caráter por meio da solidão e da dor. Sei que não estou sozinha — sua presença constante, pedindo colo, leite, carinho e cuidado, me lembra disso. Mas, às vezes, ali naquele deserto, eu olho pra você, tão pequeno e vulnerável, e vejo em mim outra criança: frágil, insegura, morrendo de medo de errar.”
 
Os meses e anos que se seguiram não aliviaram imediatamente a sensação de esgotamento e solidão. Um dia, ouvi da minha antiga terapeuta que eu não deveria ter outro filho sem antes mudar meu olhar sobre a maternidade. Achei o conselho invasivo, até ofensivo.
 
Mas quando Mariana, minha caçula, tinha 18 meses, eu quebrei.

Estava exausta.

Era um cansaço físico, sim — noites mal dormidas, corpo sobrecarregado. Mas também era emocional, espiritual. As flutuações hormonais, os cuidados com uma criança de quatro anos e outra de um ano e meio, a solidão diária, e principalmente o medo. Medo de fazer tudo errado. Medo de ferir meus filhos emocionalmente a ponto de quebrá-los.

No fim, esse medo quebrou foi a mim.

E quando contemplei meus estilhaços — em meio ao luto por uma vida que já não existia — percebi os primeiros raios de sol. Silenciosos, mas quentes. Luminosos. A luz brilhou mais forte depois de uma noite longa e fria.



Quando achei que havia perdido tudo, inclusive a mim mesma, eu encontrei a Graça.
Em meio ao meu desespero existencial, fui surpreendida pela Esperança.
A maternidade foi o fim de uma vida boa — e o início de uma vida muito melhor.
Levei alguns anos e derramei muitas lágrimas até compreender isso. Por essa razão, me compadeço das mães que cruzaram a linha do desespero e ainda não saíram de lá.
 
O que mudou minha perspectiva?

Sim, meus filhos cresceram. Suas demandas hoje são diferentes — não sou mais um zumbi vagando pela casa noite após noite. Mas a mudança mais profunda não foi em torno deles. Foi dentro de mim.

Hoje entendo que minha antiga perspectiva era autocentrada.

No dia mais triste da minha vida, ouvi Deus me falar:
“Você não é o centro.”

E foi essa compreensão que mudou completamente o jogo.
Minhas emoções, boas ou ruins, não são o centro do universo — e nem mesmo o centro da minha vida.
 
Minhas aptidões como mãe não definem o destino dos meus filhos.
Aquilo que eu chamava de desejo por liberdade era a dificuldade de sair do centro.
 
“O erro de Narciso foi olhar para si mesmo em vez de viver. Ele busca sua essência e encontra apenas a sua imagem, que nunca para de decepcioná-lo.Escreveu Louis Lavelle.

Vivemos numa sociedade autocentrada e narcisista. Buscamos nossa essência na realização pessoal. Acreditamos que a felicidade é um direito — e fazemos dela nosso objetivo de vida. Mas, enquanto a felicidade for o destino final, ela estará sempre além do arco-íris.
 
A realização pela qual tanto ansiamos requer primeiro o autoabandono.
 
Meus filhos me desafiam diariamente a olhar para eles antes de olhar para mim. E nessa entrega diária - ainda tão doída e tão visceral - descubro novas nuances dessa Graça que é abundante o suficiente para cobrir uma multidão de pecados.
 
Continuo sendo, diariamente, surpreendida pela Esperança.
 
  • Erica Neves é professora de jornalismo, na UFG, e de teologia, no Invisible College. É casada com Fred, mãe do Pedro e da Mariana e membro da Igreja Presbiteriana Bereia, em Goiânia.

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