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Opinião

Sociedade do glamour e ética da verdade

Anderson Clayton

O belo é contagiante. Esta é uma afirmação peremptória da sociedade do glamour. A finalidade psicológica da exaltação da beleza é produzir o encanto inebriante e, por que não dizer, a experiência com o “fascinium”. O objeto da estética, segundo Hegel, é o belo artístico criado pelo ser humano. Só que, ao falarmos desta engenharia, não podemos ignorar o fato de que ele (o belo) é uma produção sociocultural que revela o status dominante de uma preferência socialmente imposta como valor de tendência hegemônica. Por esta razão, é possível admitirmos que os critérios de mensuração estética de beleza podem ser quantificados. Na economia do belo se agrega valores estéticos determinados por uma espécie de “racionalidade capitalística”.

Neste sentido, a beleza acaba revelando -- a partir dos critérios desta racionalidade -- que a “ontologia do perfeito” também possui uma escala de gradação estética quantificável: do perfeito ao mais perfeito ainda. E sob o invólucro desta dialética, a sociedade da opulência exibe sua vocação glamourizante ao produzir encantos e sugestões através da política de uma moral consumista, preconizando, assim, por meio dela, a possibilidade que cada pessoa tem de romper os grilhões impostos historicamente pela cultura da repressão (psicoeconômica).

A necessidade de se maximizar o capital estético na sociedade do glamour, no entanto, produz suas anomalias, suas psicopatias. A ganância (do grego “pleonexia”) para se viver sob o “holofote da admiração alheia” (síndrome da holofotização), bem como obter a apreciação estética favorável a todo custo tornam as pessoas muito mais vulneráveis do ponto de vista psicoético. A beleza é um valor que pode ser normatizado culturalmente, tornando-se produto de consumo social altamente cotado na economia da racionalidade capitalística. Nela, o “ethos” do bem deve produzir sua psicologia: o sentimento de gratificação imediata.

Assim sendo, a estrutura axiológica (valores) de uma ordem sociocultural em que ela ramifica sua epifanicidade (existência manifesta) pode gerar comportamento esquizofrênico. Pois nela, as pessoas podem lograr assimilar a lógica psíquica de um comportamento moral que seja compatível com o valor estético que dela se espera. A beleza produz não somente um custo econômico, mas também um custo moral. Para ela (beleza) se projetam expectativas éticas que valorizem ainda mais seus traços arquitetônicos. Ela não tem apenas uma fisionomia anatômica, com cores, cheiro e traços estéticos glamourizantes que agrega a “admiração” como vantagem comparativa na relação com o outro: sua lógica estética tem efeito moral capaz de produzir um senso neurótico de referencialidade “autoinclusivo” (produz senso de autosatisfação).

A moral da beleza é também objeto de consumo social à medida que nela a fome de “autoexaltação” (“hybris”) das pessoas -- fome esta que gera aceitação irrestrita na interatividade do “eu-tu” -- encontra seu potencial integrativo confirmado. No “tapete vermelho” de Hollywood, a beleza desfila a nobreza de um comportamento moral capaz de produzir “encanto social”, tornando as celebridades que nele desfilam objeto de desejo a ser consumido tanto estética quanto moralmente. Saber se a “fotografia” que se consume no “palco das celebridades” tem conexão vital com o “mundo real” das pessoas que nele desfilam “beleza ostensivamente” é uma preocupação que pouco afeta o imaginário social.

No tapete do glamour, as expectativas que se projetam para as pessoas revestidas de beleza são aquelas que figuram um tipo de “comportamento moral” que seja compatível com suas qualidades estéticas, mesmo que estas escondam predicados morais pouco atrativos do ponto de vista de uma apreciação ética não glamourizante.

A gramática da beleza possui a sua própria lógica. A reivindicação moral que nasce do apelo ético da fé cristã parece ter produzido pouco ou quase nenhum impacto sobre ela. A não rara combinação das variáveis “valorização estética da beleza” e a “glamourização dos ideais do impulso aquisitivo”, presentes no capitalismo de consumo, produziu uma inversão axiológica na ordem social vigente. As pessoas, em regra geral, parecem estar muito mais comprometidas com a forma arquitetônica da beleza do que com o conteúdo eticamente duvidoso que dela pode se desdobrar negativamente. A política de satisfação dos desejos parece querer transformar a beleza numa espécie de arquétipo comportamental que gera uma psicologia de expectativa social que jamais se sentirá saciada com e na operacionalização do “impulso aquisitivo”, usando as palavras Max Weber.

O que alimenta a psicologia do impulso aquisitivo numa sociedade do glamour?
É provável que a sociedade do glamour tenha produzido uma doença psicomoral incurável no senso da coletividade social, a saber: uma psicologia de “inadequação arquitetônica” ao sempre novo arquétipo de beleza heteroimposto pelo capitalismo de consumo, o que acaba produzindo um distanciamento moral das autoidentidades (individuais) que cada pessoa tem de si mesma.

A meta autoimposta de atingir o ideal hegemônico de beleza socialmente modelada-comercializada pela cultura de massa acaba gerando uma autocompreensão distorcida e fortemente impregnada pelo complexo de autorrejeição. Quanto mais se busca adequar ao modelo preconizado no e pelo “outro”, tanto menos se valoriza os próprios predicados autoidentitários. A tendência, no geral, se torna “patologizá-los”. As pessoas se aceitam “cada vez menos” diante do modelo cultural hegemônico comercializado pela sociedade do glamour. E nela elas são condicionadas a se rejeitarem sempre mais quando comparadas ao modelo de tendência sociocultural preconizado no outro.

Além da pleonexia (ambição de querer sempre mais), a “síndrome do consumismo” (Zygmunt Bauman) também evidencia dois outros tipos de patologias sociomorais: a cobiça (epithumia) e a inveja (ftónoi). O autodescontentamento é sempre reflexo psicológico da perfectibilidade ontológica que se visibiliza no outro. A lógica desta psicologia aparece figurada no diálogo da serpente com a mulher na narrativa do Bereshit (Gênesis). O fruto do conhecimento do bem e do mal só é cobiçável para Eva porque lhe conferirá algo do outro que faltava nela. Desta forma, ela deseja o que o outro tem (cobiça) para se tornar como o outro é (inveja).
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