Opinião
17 de junho de 2025
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A refeição de Emaús e a Ceia do Senhor em Frans Snyders
Ao olhar-nos nos olhos, a jovem com o cacho de uvas em sua mão, nos coloca diante de uma escolha
Por Marleen Hengelaar-Rookmaaker
O pintor antuerpiense, Frans Snyders (1579-1657), nos presenteia com uma mesa ricamente repleta de vegetais, nozes, frutas e aves, pão e vinho. A pintura é banhada de luz, sua composição é bem-equilibrada e o espectro de sua paleta é vibrante. A jovem mulher (a dona da casa ou a criada) sorri gentilmente para nós, com uma expressão aberta e um adorável chapéu de renda de Bruges. Abaixo, à direita, um gato divertido tenta pegar em segredo sua parte da mesa. À primeira vista, a obra parece, simplesmente, uma cena agradável na cozinha, uma alegre celebração pela abundância da vida.
Mas, você já percebeu? Atrás da mesa, uma vista para um espaço atrás da cozinha foi pintada, onde – como o título do trabalho nos conta – Jesus e dois de seus seguidores cearam juntos. A combinação de natureza-morta com histórias religiosas – como aquelas sobre Emaús e Maria e Marta, por exemplo – não era incomum nessa época. Às vezes, a cena religiosa ao fundo parece uma desculpa trivial para a exibição suntuosa de comida à frente. No entanto, a questão é se esse é o caso aqui.
Isso nos leva de volta à mesa da cozinha. Como era muito comum em naturezas-mortas por volta do século 18, os vários elementos nessa pintura têm um significado simbólico. No século 17, as naturezas-mortas – e de uma forma geral, pinturas de flores, paisagens, interiores de igrejas e cenas do cotidiano – raramente eram representações naturalistas de cenas aleatórias, mas, normalmente, era cuidadosamente compostas com um significado bíblico e moral mais aprofundados. Isso se torna claro assim que olhamos para o que é retratado no centro da cena na cozinha: um cacho de uvas, erguido pela jovem para que todos vejam, e à frente dele, uma maçã. Uma fruta que representa o pecado (a ‘maçã’ da queda) e outra que representa a graça (a uva vermelha, que remete ao vinho, que, por sua vez, representa o sangue de Cristo).
Os outros elementos da natureza-morta elaboram ainda mais o contraste entre queda e redenção, a antiga e a nova vida. O jarro de vinho, a taça e o pão da eucaristia pertencem à nova vida, assim como a cesta transbordante, que age como uma variação da cornucópia ou chifre da abundância. À antiga vida pertencem o galo (pense na negação de Pedro em ser um seguidor de Jesus), os pássaros mortos e o gato, que, sorrateiramente, puxa para si o pássaro e é guiado pelos desejos em seu coração.
A jovem fica for a desse contraste, mas, ao olhar-nos nos olhos, com o cacho de uvas em sua mão, ela nos coloca diante de uma escolha. Escolhemos uma vida superficial que gira em torno de nossa satisfação egoísta ou uma vida uma dimensão extra, focada em Jesus e seu reino? Optamos pelos frutos proibidos ou pela Ceia do Senhor?

A refeição de Emaús ao fundo liga-se com a Ceia do Senhor, a refeição em que Jesus abençoa o pão e permite que seus discípulos descubram que ele é seu mestre ressuscitado (Lc 24.13-35). Normalmente, essa cena se passa em um quarto escuro, mas, aqui, a luz recai sobre a mesa através de uma janela com ripas de madeira no formato de uma cruz. E, como a sala de jantar está banhada de luz, o artista poderia acrescentar uma terceira camada de significado à obra: uma pintura na parede atrás de Jesus onde podemos decifrar (depois de olhar com muita atenção) uma figura que está pregando para uma multidão, com sua mão apontando para cima. Esse poderia ser Jesus, abrindo as Escrituras ou, talvez, João Batista, o último dos profetas, apontando para Jesus.
Isso nos leva ao coração da história de Emaús: Jesus, que abre os olhos de seus seguidores ao expor sua Palavra. Mas isso não é tudo. Ele também faz com que eles vejam a verdade do que foi dito anteriormente – quando ele abençoou a refeição – mostrando a eles a sua mão perfurada. E, então, eles veem, assim como Tomé, com seus próprios olhos: Jesus realmente ressuscitou!
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Arte: Frans Snyders: A Cena na cozinha; Cristo em Emaús, 1620, óleo sobre madeira, 115 x 102 cm. Museu Nacional Brukenthal, Sibiu, Romênia.
Frans Snyders ou Snijders (1579-1657) foi um pintor flamengo barroco e católico, conhecido como o mais destacado pintor de animais do século XVII. Seus temas incluíam naturezas-mortas de mercados e despensas (com animais vivos e caça abatida), animais em combate e cenas de caça. Um pintor altamente habilidoso, celebrado por sua capacidade de capturar texturas e jogos de luz em penas e pelos, Snyders fez parte de um grupo de artistas que ajudou a transformar Antuérpia de uma cidade de comércio e finanças em um vibrante centro artístico. A estalagem mantida pelos pais de Snyders era frequentada por artistas. Jovem, ele estudou com Pieter Bruegel, o Jovem, e possivelmente com Hendrik van Balen, primeiro mestre de Anthony Van Dyck. Tornou-se mestre em 1602 na Guilda de São Lucas, a associação de pintores de Antuérpia. Como outros artistas flamengos, visitou a Itália, passando vários meses em Roma (1608-09) e depois em Milão, onde seu patrono foi o cardeal Federico Borromeo. Por volta de 1610, de volta a Antuérpia, iniciou uma longa amizade e colaboração com Peter Paul Rubens. Em 1611, casou-se com Margriet (Margaretha) de Vos, irmã dos pintores Cornelis e Paul de Vos. Snyders foi nomeado pintor principal do arquiduque Alberto VII da Áustria e príncipe soberano dos Países Baixos, para quem executou algumas de suas melhores obras. Filipe III da Espanha também lhe encomendou várias cenas de caça.
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Publicado no site ArtWay. Reproduzido com permissão da autora.
Traduzido por Ana Laura Morais.
REVISTA ULTIMATO – LIVRA-NOS DO MAL
O mal e o Maligno existem. E precisamos recorrer a Deus, o nosso Pai, por proteção.
O que sabemos sobre o mal? A que textos bíblicos recorremos para refletir e falar do assunto? Como o mal nos afeta [e como afetamos outros com o mal] e porque pedimos para sermos livres dele? Por que os cristãos e a igreja precisam levar esse assunto a sério?
É disso que trata a matéria de capa da edição 413 da revista Ultimato. Para assinar, clique aqui.
Saiba mais:
» A Arte e a Bíblia, Francis Schaeffer
» A Arte Não Precisa de Justificativa, H. R. Rookmaaker
» O céu está cheio de borboletas, por Marleen Hengelaar-Rookmaaker
Por Marleen Hengelaar-Rookmaaker

Mas, você já percebeu? Atrás da mesa, uma vista para um espaço atrás da cozinha foi pintada, onde – como o título do trabalho nos conta – Jesus e dois de seus seguidores cearam juntos. A combinação de natureza-morta com histórias religiosas – como aquelas sobre Emaús e Maria e Marta, por exemplo – não era incomum nessa época. Às vezes, a cena religiosa ao fundo parece uma desculpa trivial para a exibição suntuosa de comida à frente. No entanto, a questão é se esse é o caso aqui.
Isso nos leva de volta à mesa da cozinha. Como era muito comum em naturezas-mortas por volta do século 18, os vários elementos nessa pintura têm um significado simbólico. No século 17, as naturezas-mortas – e de uma forma geral, pinturas de flores, paisagens, interiores de igrejas e cenas do cotidiano – raramente eram representações naturalistas de cenas aleatórias, mas, normalmente, era cuidadosamente compostas com um significado bíblico e moral mais aprofundados. Isso se torna claro assim que olhamos para o que é retratado no centro da cena na cozinha: um cacho de uvas, erguido pela jovem para que todos vejam, e à frente dele, uma maçã. Uma fruta que representa o pecado (a ‘maçã’ da queda) e outra que representa a graça (a uva vermelha, que remete ao vinho, que, por sua vez, representa o sangue de Cristo).
Os outros elementos da natureza-morta elaboram ainda mais o contraste entre queda e redenção, a antiga e a nova vida. O jarro de vinho, a taça e o pão da eucaristia pertencem à nova vida, assim como a cesta transbordante, que age como uma variação da cornucópia ou chifre da abundância. À antiga vida pertencem o galo (pense na negação de Pedro em ser um seguidor de Jesus), os pássaros mortos e o gato, que, sorrateiramente, puxa para si o pássaro e é guiado pelos desejos em seu coração.
A jovem fica for a desse contraste, mas, ao olhar-nos nos olhos, com o cacho de uvas em sua mão, ela nos coloca diante de uma escolha. Escolhemos uma vida superficial que gira em torno de nossa satisfação egoísta ou uma vida uma dimensão extra, focada em Jesus e seu reino? Optamos pelos frutos proibidos ou pela Ceia do Senhor?

A refeição de Emaús ao fundo liga-se com a Ceia do Senhor, a refeição em que Jesus abençoa o pão e permite que seus discípulos descubram que ele é seu mestre ressuscitado (Lc 24.13-35). Normalmente, essa cena se passa em um quarto escuro, mas, aqui, a luz recai sobre a mesa através de uma janela com ripas de madeira no formato de uma cruz. E, como a sala de jantar está banhada de luz, o artista poderia acrescentar uma terceira camada de significado à obra: uma pintura na parede atrás de Jesus onde podemos decifrar (depois de olhar com muita atenção) uma figura que está pregando para uma multidão, com sua mão apontando para cima. Esse poderia ser Jesus, abrindo as Escrituras ou, talvez, João Batista, o último dos profetas, apontando para Jesus.
Isso nos leva ao coração da história de Emaús: Jesus, que abre os olhos de seus seguidores ao expor sua Palavra. Mas isso não é tudo. Ele também faz com que eles vejam a verdade do que foi dito anteriormente – quando ele abençoou a refeição – mostrando a eles a sua mão perfurada. E, então, eles veem, assim como Tomé, com seus próprios olhos: Jesus realmente ressuscitou!
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Arte: Frans Snyders: A Cena na cozinha; Cristo em Emaús, 1620, óleo sobre madeira, 115 x 102 cm. Museu Nacional Brukenthal, Sibiu, Romênia.
Frans Snyders ou Snijders (1579-1657) foi um pintor flamengo barroco e católico, conhecido como o mais destacado pintor de animais do século XVII. Seus temas incluíam naturezas-mortas de mercados e despensas (com animais vivos e caça abatida), animais em combate e cenas de caça. Um pintor altamente habilidoso, celebrado por sua capacidade de capturar texturas e jogos de luz em penas e pelos, Snyders fez parte de um grupo de artistas que ajudou a transformar Antuérpia de uma cidade de comércio e finanças em um vibrante centro artístico. A estalagem mantida pelos pais de Snyders era frequentada por artistas. Jovem, ele estudou com Pieter Bruegel, o Jovem, e possivelmente com Hendrik van Balen, primeiro mestre de Anthony Van Dyck. Tornou-se mestre em 1602 na Guilda de São Lucas, a associação de pintores de Antuérpia. Como outros artistas flamengos, visitou a Itália, passando vários meses em Roma (1608-09) e depois em Milão, onde seu patrono foi o cardeal Federico Borromeo. Por volta de 1610, de volta a Antuérpia, iniciou uma longa amizade e colaboração com Peter Paul Rubens. Em 1611, casou-se com Margriet (Margaretha) de Vos, irmã dos pintores Cornelis e Paul de Vos. Snyders foi nomeado pintor principal do arquiduque Alberto VII da Áustria e príncipe soberano dos Países Baixos, para quem executou algumas de suas melhores obras. Filipe III da Espanha também lhe encomendou várias cenas de caça.
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- Marleen Hengelaar-Rookmaaker tem doutorado com laude em musicologia pela Universidade de Amsterdã, nos Países Baixos. Por muitos anos trabalhou como editora, tradutora e escritora. Editou o título The Complete Works de seu pai, o historiador de artes Hans Rookmaaker, e produziu a revista LEV para a L"Abri holandesa. Escreveu vastamente sobre música popular, liturgia e artes visuais. É casada e tem três filhos crescidos.
Publicado no site ArtWay. Reproduzido com permissão da autora.
Traduzido por Ana Laura Morais.

O mal e o Maligno existem. E precisamos recorrer a Deus, o nosso Pai, por proteção.
O que sabemos sobre o mal? A que textos bíblicos recorremos para refletir e falar do assunto? Como o mal nos afeta [e como afetamos outros com o mal] e porque pedimos para sermos livres dele? Por que os cristãos e a igreja precisam levar esse assunto a sério?
É disso que trata a matéria de capa da edição 413 da revista Ultimato. Para assinar, clique aqui.
Saiba mais:
» A Arte e a Bíblia, Francis Schaeffer
» A Arte Não Precisa de Justificativa, H. R. Rookmaaker
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