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Opinião

Os pioneiros

Neste mês de maio comemoramos os 160 anos da chegada ao Brasil do casal Robert Reid Kalley e Sarah Poulton Kalley. Em 10 de maio de 1855, eles aportaram no município da corte do Rio de Janeiro, em tempos difíceis para a pregação do Evangelho e para o protestantismo. No dia 19 de agosto, realizaram a primeira escola dominical em língua portuguesa para cinco crianças.

O Império do Brasil tinha cerca de 14 milhões de habitantes, praticava o escravismo e a monocultura como base econômica, e a religião oficial era o catolicismo romano. Éramos já uma sociedade extremamente desigual tanto na economia como na forma em que as relações sociais se davam, mediadas pelas discriminações e pelo racismo, praticados contra negros, indígenas e mulheres. A minoria branca proprietária de terras controlava a política com o seu “teatro de sombras”, como disse o historiador José Murilo de Carvalho, alijando as pessoas das decisões políticas.

O analfabetismo da grande maioria da população juntava-se às epidemias como a febre amarela nos centros urbanos em início de expansão. A religiosidade popular em suas devoções no dia a dia misturava as tradições católicas com as dos cultos africanos e das pajelanças indígenas. A Igreja Católica esforçava-se por moralizar o clero e torná-lo mais identificado com o ritual e o padrão de Roma. Acentuavam-se os conflitos com o Estado que deveria custear os seus serviços religiosos e o salário dos sacerdotes. O regime do padroado esgotava-se depois de três séculos da simbiose entre o Estado e a Igreja.

Ante a pobreza e a exploração, a maioria da população construía formas de solidariedade e estratégias de sobrevivência nas cidades (comércio, pequenos serviços ou ‘bicos’) e no campo (lavoura), mesmo entre os escravos. Por causa destes e de outros fatores, muitas tensões sociais e revoltas ocorriam em diferentes províncias como na Bahia, Pernambuco e Maranhão (balaiada).

Mas o império despontava, sendo ainda a única monarquia do continente americano, como o destino para imigrantes portugueses, italianos e alemães, na sua maioria. Em 1850, deu-se o fim do tráfico de escravos e os nascidos daí em diante seriam livres. O café se tornaria nas décadas seguintes a principal atividade econômica voltada para a exportação e nas cidades cresceriam as camadas médias letradas. O parlamentarismo expressava as contradições do regime político em suas alianças com os grandes proprietários de terras e de escravos, e com a Igreja Católica.

Foi neste cenário que o casal Kalley chegou a fim de pregar o Evangelho, já amadurecido de outras experiências missionárias e das viagens pelo mundo. Robert era de origem presbiteriana e Sarah era congregacionalista. A passagem pela Ilha da Madeira na década anterior (1838-1846) e os conflitos religiosos e políticos causados por sua prática como médico e missionário protestante, custaram a Kalley a fuga do potentado português, junto com outros madeirenses convertidos.

No Rio de Janeiro, reuniram alguns refugiados madeirenses, portugueses e brasileiros convertidos que foram batizados formando a Igreja Evangélica Fluminense em 1858, uma igreja independente. Kalley teve embates jurídicos acerca da questão da liberdade religiosa por conta de perseguições em Petrópolis. Polemizou nos jornais e traduziu textos clássicos da literatura protestante como “O Peregrino”. Tornou-se um amigo pessoal do imperador D. Pedro II e praticou a vacinação em escravos. Sarah iniciou a escola dominical junto com práticas educacionais, traduziu hinos religiosos estruturando a primeira hinologia protestante no Brasil (Salmos e Hinos) e escreveu um livreto, “A Alegria da Casa”, com lições de higiene e economia doméstica, o qual foi utilizado pelo império nas escolas públicas da época.

O casal ficou até o ano de 1876 no Brasil. Seu legado para o Evangelho e para a sociedade brasileira permanece. O protestantismo oriundo da Reforma Protestante - e que completará 500 anos em 2017 - teve no Brasil a fundamental contribuição das ações sociais (medicina, educação e música), missionárias, jurídicas e diplomáticas dos Kalley.

A leitura e a prática da missão não se reduziam a um projeto denominacionalista a serviço de interesses que usaram o protestantismo para seus objetivos civilizacionais e maçônicos ao gosto das camadas dominantes. A prática dos cultos domésticos diários foi uma estratégia para evitar as perseguições e para socializar o evangelho para as camadas mais simples e iletradas da sociedade, no espaço privado da casa e da intimidade, não na suntuosidade dos templos. Desta forma, o evangelho foi inserido no cotidiano brasileiro da corte numa linguagem mais informal e no diálogo com os dramas das pessoas simples, junto com ações mais amplas como a educação, a literatura e a música.

O casal Kalley não escreveu relatórios missionários para satisfazer as estruturas eclesiásticas em suas formalidades institucionais. Seu compromisso era com o Evangelho do Reino, somente. Antes, deixaram escritos, cartas, anotações, sermões, planilhas de gastos, esboços, confissões, orações, relatos e descrições de experiências. Todo este material foi reunido décadas depois em forma de um diário pelo filho adotivo do casal, João Gomes de Rocha, em quatro volumes, intitulado “Lembranças do Passado” Contudo, deixaram também uma proposta de missão no contexto urbano a partir do diálogo, da simplicidade e do testemunho do Evangelho, pelo Evangelho e para o Evangelho.

Fonte:
ROCHA, João Gomes da. “Lembranças do Passado”. Rio de Janeiro: Novos Diálogos, 2015. Volumes I, II e III.

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Foto: Marcelo Pereira/Fotos públicas (27/05/2015)
Lyndon de Araújo Santos é historiador, professor universitário e pastor da Igreja Evangélica Congregacional em São Luís, MA. Faz parte da Fraternidade Teológica Latino-americana - Setor Brasil (FTL-Br).
  • Textos publicados: 35 [ver]

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