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Opinião

Ame o idoso

Por Augusto Gotardelo

Completo hoje (2 de outubro de 1987) setenta e cinco anos. Segundo Moisés, Salmo 90.10, estou no rol dos robustos. Poucos atingem o cume a que chego. Fazem-me bem estes versos de Alberto de Oliveira: “Poucos vingam o cimo em que ora estamos:/ Árvores altas não nos tocam os ramos/ O sopro mau que aí embaixo os agita./ Bendita e rebendita/ A idade austera e nobre a que chegamos!” “Tudo aqui em cima é paz, calma, infinita.../ Bendita e rebendita/ Seja a velhice, de paixões isenta!”.

Vejo-me no alto de um monte, tenho os olhos perdidos na campina percorrida, o coração banhado de luz para reconhecer com ação de graças todos os favores de Deus.

Fala o autor do Salmo 126 da volta jubilosa daqueles que traz em feixes nos braços depois de uma semeadura com lágrimas. Parece - me ver alguém sob a luz suave do acaso, em cânticos, feliz, abraçado a feixes de trigo, no retorno ao lar, ansioso por encontrar-se dentro dele, no gozo da mansuetude que o envolve. Não tem o longevo a terna sensação de volta ao lar de Deus, de segurar molhos imensos que colheu no trigal da esperança, do sonho de realizações que o Senhor o abençoou? Nesses instantes de luz frouxa, de cansaço, de pressa pelo repouso da noite que se avizinha, todos gostam de dirigir a Jesus o pedido que lhe fizeram o peregrino de Emaús na hora meritória de um crepúsculo de perpetua recordação: “Fica conosco, porque é tarde e o dia já declina” (Lucas, 24.29).

>> Fui Moço, Agora Sou Velho... E Daí? <<

Vou sentindo o que experimentaram todos que chegam a estas alturas. Diante do espelho, atentando para as marcas do tempo nos cabelos, nos dentes, na pele, no brilho dos olhos, esboça-se me no espírito certa autorrejeição em completa desarmonia com a resignação cristã, com a humildade que deve haver nos que têm a benção da ancienidade. Preciso refletir que até a natureza apresenta contrastes, perdas desgastes clamorosos. O sol tem majestade e gloria no zênite; depois no poente, a suavidade do rosicler da aurora.

A longevidade tem alto preço. Digam - no os octogenários e os nonagenários, principalmente os que vivem nos asilos, nas clínicas geriátricas, longe do carinho doméstico, da ternura dos parentes. Solidão, impressão de que são inúteis, deficiências físicas e insegurança são alguns dos males que afligem os anciãos. Felizes os velhos que têm fé abundante, que esperam no Senhor, que podem dizer como Davi: “Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal nenhum, porque Tu estás comigo, a Tua vara e o Teu escudo me consolam” (Salmo 23:4).

Não há solidão para o velho crente. Se é fonte rica de conselhos, de experiências valiosas, nunca é inútil. Não realiza certas obras de puerícia, da juventude, mas pode construir algo nobre no coração e na mente daqueles que o cercam.

Mais importante que o bastão em que se firma, do que as mãos que o amparam, é o bordão da fé e da esperança em Cristo.

>> É Preciso Saber Envelhecer <<

A velhice deve ser o coroamento da existência humana. Gosto da palavra de Jacó a Faraó quando este lhe perguntou: “Quantos são os dias dos anos de sua vida?” O aspecto físico do patriarca por certo impressionou os olhos de Faraó. Ali estava a coroa de uma vida de provações: fala morosa, olhos embaciados, rugas, cabeça prateada.

Que de lições há na resposta de Jacó! Disse ele: “Os dias dos anos da minha peregrinação são cento e trinta anos; poucos e maus foram os dias dos anos de minha vida, e não chegaram aos dias dos anos da vida de meus pais nos dias das suas peregrinações” (Genesis, 47:8-9). Eram todos peregrinos neste mundo. Quando o homem se julga peregrino na terra, revela que crê na vida futura, que espera em Deus, que não vê na sepultura o fim de tudo.

É na senectude o estágio da vida em que se colhem os frutos da mocidade. Ensina Paulo que o homem ceifa o que semeia (Gálatas, 6:7).

Aquele que deseja colher frutos abençoados nos últimos dias, ou quer evitar as agressões da solidão e outros incômodos, deve meditar nestas palavras de Jesus: “E Aquele que me enviou está comigo, não me deixou só, porque eu faço tudo que Lhe agrada” (João 8.29).

Agradar a Deus no alvorecer da vida, harmonizar-se com Ele, aplicar ao viver os ensinos da Escritura, é garantir na velhice a paz que a consciência pesada costuma obscurecer nos dias derradeiros. Disse o Mestre que o Pai o pouparia a solidão, nunca O deixara só, porque fazia sempre o que agradava a Ele.

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Castiga-me a ideia de que agora produzo pouco com maior esforço. Contudo consola-me a certeza de que ainda estou sendo útil. Winston Churchill morreu aos noventa anos; Konrad Andenauer partiu aos noventa e um. Foram cidadãos úteis até os últimos dias. Escreve Austregésilo de Athayde: “O que cumpre é mudar de ideia, em geral falsa, de que a idade incapacita para o trabalho”. A poetisa Cora Coralina (pseudônimo literário de Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas) aos noventa e três anos de idade, produzindo ou dando asas ao seu estro, mereceu do brasileiro ilustre retrocitado esta apreciação elogiosa: “Cora Coralina oferece-nos a todos a sua receita de longevidade”. Para chegar a esta proximidade dos cem anos ativa, lúcida e participante, recomenda muita pobreza e muito trabalho. Quanto à pobreza não sei se é vitamina estimuladora. O trabalho sim. “O trabalho é o sustento da velhice” (“Labor senectutis obsonium”). O pintor Marc Chagall, aos noventa e cinco anos, afirmava: “Parar de trabalhar é começar a morrer.” Pedro Sampaio, em erudito artigo (O Envelhecer) lembra isto que muitos leitores perseverantes já conhecem: “Verdi compôs Otello aos 73 anos e deu a luz a Falstaff aos 79 anos”. Goethe já era setuagenário quando escreveu a segunda parte do Fausto. Humboldt produziu os cinco volumes do seu kosmos entre 76 e 89 anos. Galileu e Laplace, já entrados na década dos 80, continuaram a enriquecer o mundo com suas admiráveis produções cientificas”.

Acabrunham - me também os claros que surgem no anfiteatro secreto de minhas afeições. Há dentro de mim um anfiteatro. Centenas de amigos ocupam seus lugares. De quando em quando parte um para estar com o Senhor. Lá fica o claro, o vazio que traz saudades e pesar. Esses companheiros da mesma faixa etária que deixam lugares vagos fazem-me pensar nesta declaração de Davi: “Eu vou pelo caminho de todos os mortais” (1 Reis 2.2). Repetindo-a em ações de graças faço-lhe este delicioso acréscimo: Mas nem todos os mortais vão pelo caminho em que estou. A reta traçada por Jesus Cristo (João 14.16). Glória a Deus!

>> Não basta viver mais <<

Sou o que sou pelo auxílio de Deus. Creio no seu amor sem igual, na sua providência de todos os dias, no ensino segundo o qual a paciência e a consolação das Escrituras geram em mim incomparável esperança (Romanos 15:4).

E “os que esperam no Senhor renovam as suas forças, sobem com as asas como águias, correm e não se cansam, caminham e não se fatigam” (Isaías 40.31).

Está você no vigor dos anos? Ame o ancião que já foi como você. Amanhã quando as cãs lhe branquearem a cabeça, será alvo também deste afeto, dessa ternura tão necessária nesse por-de sol da vida.

Nota: Artigo publicado originalmente na revista Ultimato, edição de outubro de 1987, p 61.

• Augusto Gotardelo
(1911- 2005) foi escritor, pregador presbiteriano e professor. Nascido em Monte Sião, Sul de Minas, era filho de João e Alice Gotardelo. Foi casado – durante 47 anos – com Hilarina Vitral Gotardelo, com quem teve cinco filhos (Beatriz, Heloísa, Lúcia, Augusto Júnior e Alice). E, depois, com Maria Matilde Mendes. Augusto Gotardelo colaborou com Ultimato, entre os anos de 1968 a 1974, como articulista da seção “Português pela Bíblia”.

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